Papelão e substância cancerígena ou exagero? O que se sabe - e o que é dúvida - na Operação Carne Fraca:imoveis praia do cassino

carne

Crédito, Reuters

Legenda da foto, "Eles usam ácidos, outros ingredientes químicos,imoveis praia do cassinoquantidades muito superiores à permitida por lei pra poder maquiar o aspecto físico do alimento estragado ou com mal-cheiro", disse o delegado da PF ao deflagrar a operação

A engenheiraimoveis praia do cassinoalimentos Carmen Castillo, da ESALQ - USP (Escola Superiorimoveis praia do cassinoAgricultura Luizimoveis praia do cassinoQueiroz), pontua que alguns ingredientes citados nas acusações, como o ácido ascórbico, são necessários para o processamento dos alimentos e é preciso tomar cuidado para não "demonizá-los".

"Não é problema usar esses ingredientes (em alimentos processados e embutidos), o problema é não respeitar os níveis permitidos na lei", disse à BBC Brasil.

De acordo com a Polícia Federal, esse seria um dos delitos cometidos pelas empresas, que utilizavam ingredientes no processamentoimoveis praia do cassinocarnesimoveis praia do cassinoquantidades acima do que determina a regulamentação.

Salsichaimoveis praia do cassinoporco
Legenda da foto, Carnes usadas como matéria-prima na produçãoimoveis praia do cassinoembutidos e processados foram a principal fonteimoveis praia do cassinoirregularidades encontradas pela PF

"Eles usam ácidos, outros ingredientes químicos,imoveis praia do cassinoquantidades muito superiores à permitida por lei pra poder maquiar o aspecto físico do alimento estragado ou com mau cheiro", explicou o delegado da PF responsável pela investigação, Maurício Moscardi Grillo,imoveis praia do cassinoentrevista coletiva na sexta-feira.

A operação deflagrada pela PF foi a maiorimoveis praia do cassinosua história e revelou que empresas do setor, incluindo as as gigantes JBS e a BRF, adulteravam a carne que vendiam no mercado interno e externo.

A investigação também revelou um esquemaimoveis praia do cassinopropinas e presentes dados pelos frigoríficos a fiscais do Ministério da Agricultura, que supostamente recebiam para afrouxar a fiscalização e liberar a comercializaçãoimoveis praia do cassinocarne vencida e adulterada.

Sobre as acusações, a JBS se manifestou dizendo que "é a maior interessada no fortalecimento da inspeção sanitária no Brasil", ressaltando que "no despacho da Justiça Federal que deflagrou a operação, não há qualquer menção a irregularidades sanitárias ou à qualidade dos produtos da JBS eimoveis praia do cassinosuas marcas."

A BRF disse que "apóia a fiscalização do setor e o direitoimoveis praia do cassinoinformação da sociedade com baseimoveis praia do cassinofatos, sem generalizações que podem prejudicar a reputaçãoimoveis praia do cassinoempresas idôneas e gerar alarme desnecessário na população."

Exagero?

O delegado Grillo explicou os problemas encontrados na carne das empresas investigadas pela operação - que iam desde mudar a dataimoveis praia do cassinovencimento e a embalagemimoveis praia do cassinocarnes estragadas, que eram usadas como matéria-prima para embutidos, até injetar águaimoveis praia do cassinofrangos para alterar seu peso e mascarar a deterioraçãoimoveis praia do cassinocarnes com o usoimoveis praia do cassinoácido ascórbico.

"São dois anosimoveis praia do cassinoanáliseimoveis praia do cassinofatos, desde utilizaçãoimoveis praia do cassinopapelão por essas empresas - até essas que já citeiimoveis praia do cassinogrande porte (JBS e BRF) - para colocar esse tipoimoveis praia do cassinosituaçãoimoveis praia do cassinocomidas, pra fazer enlatados, e outras coisas que podem prejudicar a saúde humana. (...) Tudo isso mostra que o que interessa para esse grupo é o capitalismo, é o mercado, independente da saúde pública", disse.

"Determinados produtos, cancerígenos até,imoveis praia do cassinoalguns casos, eram usados pra poder maquiar as característicasimoveis praia do cassinoum produto estragado ou com cheiro."

Mas alguns especialistas ouvidos pela BBC Brasil avaliam o modo como as informações foram divulgadas como "sensacionalista".

"A divulgação da operação foi muito sensacionalista. Essa é uma questão pontual. Estou nesse mercado, estudando e trabalhando, há 30 anos. Uma das empresas que dirijo importava carne do Uruguai e da Argentinos até 2012. Hoje, 100% da carne que usamos é produzida no Brasil porque melhorou muito a qualidade", afirma Sylvio Lazzarini, dono do restaurante Varanda Grill,imoveis praia do cassinoSão Paulo.

Já Felício ressaltou a importância da investigação e disse que a operação revela um problema no setor, que "precisaimoveis praia do cassinouma renovação no sistemaimoveis praia do cassinofiscalização". Ele destaca, porém, que é preciso esclarecer melhor as informações divulgadas sobre ingredientes comuns na indústriaimoveis praia do cassinocarnes, como o ácido ascórbico, "que é utilizado no mundo todo".

Tanto Felício quanto Lazzarini apontaram o fatoimoveis praia do cassinoque, ao anunciar a operação, a PF não explicitou quais infrações foram cometidas por quais empresas, o que facilitaria uma "generalização" do problema.

A BBC Brasil procurou a Polícia Federal, mas não obteve resposta até o fechamento dessa reportagem.

Pataimoveis praia do cassinoporco com seloimoveis praia do cassinoinspeção brasileiro

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Legenda da foto, Sistemaimoveis praia do cassinofiscalização precisaimoveis praia do cassinorenovação, mas carne brasileira éimoveis praia do cassinoalta qualidade, segundo Pedro Felício

Papelão

Ao anunciar a operação, a PF mencionou que empresas envolvidas no esquemaimoveis praia do cassinocorrupção "usavam papelão para fazer enlatados (embutidos)".

Em uma das ligações telefônicas citadas no relatório da Polícia, funcionários da BRF falam sobre o usoimoveis praia do cassinopapelão na área onde produzem CMS (carne mecanicamente separada, comumente usada na produçãoimoveis praia do cassinosalsichas).

No áudio, é possível ouvir:

Funcionário: o problema é colocar papelão lá dentro do cms também né. Tem mais essa ainda. Eu vou ver se eu consigo colocarimoveis praia do cassinopapelão. Agora se eu não conseguiimoveis praia do cassinopapelão, daí infelizmente eu vou ter que condenar.

Luiz Fossati (gerenteimoveis praia do cassinoprodução da BRF): ai tu pesa tudo que nós vamos dar perda. Não vamos pagar rendimentos isso.

Pedro Felício acredita que a referência ao papelão não foi feita como ingrediente para o processamento da carne. "Acho muito difícil isso ter acontecido. O que acontece é que tem áreas dentro das indústrias que são chamadasimoveis praia do cassinoáreas limpas, onde não podem entrar embalagens secundárias, como caixasimoveis praia do cassinopapelão", diz.

"Na gravação que ouvi, duas pessoas falavamimoveis praia do cassinoentrar com uma embalagemimoveis praia do cassinopapelão na área limpa. Evitar papelão nessas áreas faz parte das boas práticasimoveis praia do cassinomanufatura, mas não fazer isso não é o mesmo que usar papelão dentro da salsicha."

Em nota, a empresa BRF afirmou que "houve um grande mal entendido na interpretação do áudio capturado pela Polícia Federal".

A empresa afirma que umimoveis praia do cassinoseus funcionários falava que tentaria embalar a carneimoveis praia do cassinopapelão. O produto é embalado normalmenteimoveis praia do cassinoplásticos.

"Na frase seguinte, ele deixa claro que, caso não obtenha a aprovação para a mudançaimoveis praia do cassinoembalagem, teráimoveis praia do cassinocondenar o produto, ou seja, descartá-lo", afirma a empresa.

Fachada da BRFimoveis praia do cassinoChapecó, Santa Catarina

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Legenda da foto, BRF diz que Polícia Federal interpretouimoveis praia do cassinomaneira incorreta conversa entre funcionários sobre papelãoimoveis praia do cassinocarne processada

Ácido ascórbico

O ácido ascórbico - a popular vitamina C - também foi citado pelo delegado da PF como algo utilizado para "maquiar" o aspecto da carne.

"Eles usam ácido ascórbico e outras substâncias na carne pra maquiar essa imagem ruim que ficaria se ela fosse expostas dessa forma. Inclusive cancerígenas. Então se usa esses produtos multiplicados cinco, seis vezes pela quantia permitida pela lei para que não dê cheiro, e o aspectoimoveis praia do cassinocor fique bom também", disse Grillo.

A partir daí, muitas pessoas entenderam que o ácido ascórbico é uma substância potencialmente cancerígena.

De acordo com a OMS, ela pode contribuir com distúrbios gastrointestinais, cálculos renais e outros problemasimoveis praia do cassinosaúde se for consumidaimoveis praia do cassinoexcesso e por longos períodosimoveis praia do cassinotempo, mas não há evidênciasimoveis praia do cassinorelação direta com o câncer.

Falta saber que substâncias cancerígenas estariam sendo usadas e por quais empresas,imoveis praia do cassinoacordo com a investigação da Polícia Federal.

Os especialistas alertam que o usoimoveis praia do cassinoácido ascórbico na carne não é problema.

"O uso dele tem benefícios e não é para mascarar carne adulterada. Ele tem uma função nas carnes processadas como antioxidante, ajuda a melhorar a estabilidade do sabor e reduzir o teorimoveis praia do cassinonitrito residual. O nitrito é um aditivo para realizar a cura, que é uma etapa importante no processamento da maior parte dos produtos processados. Todo ingrediente não cárneo tem função a cumprir no processamentoimoveis praia do cassinoalimentos", afirmou Carmen Castillo.

Pedro Eduardoimoveis praia do cassinoFelício pontua que o ácido ascórbico "evita que a carne fique com uma coloração marrom" e que "isso é feito no mundo todo".

A substância, segundo Felício, conseguiria mascarar a deterioração da carne no princípio, quando ela só tem algumas manchas, mas não quando o estado é mais avançado.

De qualquer forma, ela só deve ser usada somenteimoveis praia do cassinoprodutos embutidos como parteimoveis praia do cassinoseu processamento, e não nas carnes que são vendidas como matéria-prima para estes produtos - nem nas carnes compradas no supermercado.

"A carne usada como matéria-prima não deve ter qualquer aditivo, nem o ácido ascórbico. Se a Polícia achou isso, não deveria acontecer", diz.

Processamentoimoveis praia do cassinocarne

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Legenda da foto, Brasil exporta carne para maisimoveis praia do cassino150 paísesimoveis praia do cassinotodo o mundo,imoveis praia do cassinomercado que movimenta milhõesimoveis praia do cassinodólares

Salsichaimoveis praia do cassinoperu sem peru

A descobertaimoveis praia do cassinoque, no Paraná, alunos da rede pública estadual consumiram salsichaimoveis praia do cassinoperu sem carneimoveis praia do cassinoperu - preenchida com proteínaimoveis praia do cassinosoja, féculaimoveis praia do cassinomandioca e carneimoveis praia do cassinofrango - deu início à investigaçãoimoveis praia do cassinodois anos.

"Muitas vezes verificou-se a faltaimoveis praia do cassinoproteína, por exemplo, numa merenda escolar, trocada por féculaimoveis praia do cassinomandioca ou então a proteína da soja, que é muito mais barata do que a carne, então substituía. Muitas vezes até tinha a quantidadeimoveis praia do cassinoproteína suficiente, mas não era a proteína da carne, era proteínaimoveis praia do cassinooutro alimento, que não traz as mesmas substâncias pro corpo humano como a carne", afirmou o delegado.

O usoimoveis praia do cassinosoja eimoveis praia do cassinoféculaimoveis praia do cassinomandioca são comuns na produçãoimoveis praia do cassinoembutidosimoveis praia do cassinotodo o mundo, segundo os especialistas, porém é preciso respeitar as quantidades determinadas pela lei.

"É preciso observar as quantidades usadas, porque elas só podem ser usadas dentro dos limites da lei. Senão, você tem um produtoimoveis praia do cassinocarne que tem predominânciaimoveis praia do cassinomatérias-primas não cárneas", diz Felício.

Injeçãoimoveis praia do cassinoágua no frango

Segundo a PF, fiscais teriam descoberto que frangos da empresa BRF, a maior exportadoraimoveis praia do cassinofrango do mundo, teriam "absorçãoimoveis praia do cassinoágua superior ao índice permitido".

"Injetar água no frango é um problemão com o qual o Brasil vive e luta contra há muito tempo. Há oito anos que o Ministério da Agricultura é cobrado pelo Ministério Público que o frango não pode ter maisimoveis praia do cassino8%imoveis praia do cassinoágua", afirma Felício.

"É uma luta difícil. Eu não duvido que isso aconteça muito por aí, mas existe um esforço para combater."

A prática não chega a ser prejudicial à saúde, mas altera o peso da carne. "É uma fraude econômica", diz o engenheiro.

Carne

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Legenda da foto, Maisimoveis praia do cassino20 empresas estão sendo investigadas pela PF, incluindo as gigantes do setor, JBS e BRF, que negam irregularidades

Cabeçaimoveis praia do cassinoporco

O uso da carneimoveis praia do cassinocabeçaimoveis praia do cassinoporco ouimoveis praia do cassinoboiimoveis praia do cassinolinguiças é discutidoimoveis praia do cassinouma das ligações interceptadas entre os sócios do frigorífico Peccin.

A utilizaçãoimoveis praia do cassinocabeçaimoveis praia do cassinoporco é admitidaimoveis praia do cassinooutros países, segundo Felício. "Não será a melhor linguiça do mundo, mas não é prejudicial à saúde. Será um produto comestível, masimoveis praia do cassinocategoria inferior."

"No Brasil, essa carne é considerada como matéria-prima nas formulaçõesimoveis praia do cassinoembutidos cozidos, como mortadela."

O consumidor deve se preocupar?

Segundo Sylvio Lazzarini, as irregularidades encontradas pela Polícia Federal devem ser punidas, mas não representam a totalidade dos produtos feitos no Brasil e vendidosimoveis praia do cassinosupermercados e restaurantes.

"A carne brasileira evoluiu muito nos últimos anos e é muito segura. Senão o Brasil não exportaria para os países asiáticos, e muito menos para os EUA, que tem um dos maiores controles fitossanitários do planeta", diz Lazzarini.

Para o empresário, "irregularidades desse nível existemimoveis praia do cassinotodo o mundo porque bandidos existemimoveis praia do cassinotodo lugar".

O Ministério da Agricultura divulgou nota também para acalmar os ânimos dos consumidores.

"O Serviçoimoveis praia do cassinoInspeção Federal é considerado um dos mais eficientes e rigorosos do mundo. Tem um quadroimoveis praia do cassino2.300 servidores e inspeciona 4.837 unidades produtoras habilitadas para exportação para 160 países. Foi com este Serviço que construímos uma reputaçãoimoveis praia do cassinoexcelência na agropecuária e conseguimos atender às exigências rigorosasimoveis praia do cassinodiferentes nações", afirma a pasta.

Carne

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Legenda da foto, Segundo delegado da PF, consumidores podem ter comprado produtosimoveis praia do cassinoqualidade inferior ao que deveria ser fornecido.

O delegado da PF chegou a ser questionado na coletivaimoveis praia do cassinoimprensa se seria correto afirmar que "quase nenhum produto no mercado hoje está 100% livre dessas possíveis fraudes". Ele respondeu com cautela, mas não escondeuimoveis praia do cassinopreocupação.

"É possível que a gente tenha consumido alimentosimoveis praia do cassinobaixa qualidade, no mínimo, com qualidade inferior do que deveria ser fornecido."

"Hoje é realmente complicado. Tenho ido ao mercado e passeio um bom tempo até escolher um produto, mudou esse aspecto na minha vida. É difícil porque a confiança que a gente tem nas empresas, pelo menos da minha parte, mudou muito. São empresas que a gente considerava corretas, então assusta. Obviamente deve ter empresas sérias, corretas, mas na investigação foi assim, foi aparecendo uma, depois outra. Acho que a gente pode dizer que todas as empresas que a gente teve o azar ou a sorteimoveis praia do cassinoinvestigar tiveram problemas sérios. Foram quase 40."

Para evitar problemas, Pedro Eduardoimoveis praia do cassinoFelício afirma que os consumidores devem conferir se os estabelecimentosimoveis praia do cassinoonde compram carne vendem produtos com certificaçãoimoveis praia do cassinoorigem eimoveis praia do cassinoinspeção, mesmo após as acusaçõesimoveis praia do cassinocorrupçãoimoveis praia do cassinoinspetores federais.

"Este escândalo éimoveis praia do cassinodesvioimoveis praia do cassinocondutaimoveis praia do cassino33 funcionários, que foram afastados, entre maisimoveis praia do cassinoquatro mil inspetores. E o Ministério da Agricultura estar tomando atitudes para corrigir o problema. A partirimoveis praia do cassinoagora, todo mundo vai ficar alerta."

"Os erros que foram cometidos devem ser comprovados e punidos, com certeza. Mas eu não acredito que essas acusações possam ser generalizadas, acho que esse foi problema localizado e o governo terá que resolver", diz.