Mariana, 2 anos: o trágico dilema da família que precisa escolher qual dos filhos doentes tratar:3 bets

Simone Silva
Legenda da foto, Toda a família3 betsSimone Silva tem problemas3 betssaúde relacionados com a lama, mas apenas a filha mais nova pode ser tratada na rede particular | Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

O aumento3 betstranstornos psicológicos também é relatado pela população, especialmente entre os mais velhos.

Os problemas3 betssaúde que chegaram depois da lama são "evidentes", diz Roberto Waack, presidente da Fundação Renova, que hoje responde pelas ações3 betsreparação da mineradora e3 betssuas controladoras, Vale e BHP Billiton.

Para lidar com a situação aguda inicial - os problemas respiratórios, as alergias e as doenças3 betsfundo nervoso -, ele diz, a fundação contratou 22 profissionais3 betssaúde para proverem atendimento ambulatorial3 betsBarra Longa e outros 803 betsMariana.

Também serão realizados estudos para entender os "efeitos3 betslongo prazo" sobre a saúde das populações atingidas, acrescenta Waack, para tentar estabelecer relações3 betscausa e efeito para as doenças e verificar possíveis contaminações por metais pesados.

Sofia durante protesto feito por atingidos quando ação criminal contra Samarco foi suspensa pela Justiça,3 betsagosto
Legenda da foto, Sofya tem problemas respiratórios,3 betspele e dor na perna; ela tinha 9 meses quando a barragem da Samarco se rompeu | Foto: Arquivo pessoal

Escolha

Sem especialistas na cidade e diante da dificuldade3 betsmarcar uma consulta3 betsPonte Nova pelo Sistema Único3 betsSaúde, a mãe3 betsSofya, Simone Silva, passou a levá-la a um médico particular na cidade vizinha, que lhe cobrava R$ 250 pela consulta.

Foi o imunologista que,3 betssetembro do ano passado, assinou o laudo que afirmava que a menina tinha alergias na pele e dificuldade para respirar por causa da exposição à poeira3 betsrejeito3 betsminério.

A Renova havia solicitado o documento para que liberasse o pagamento3 betsparte do tratamento3 betsSofya, o que vem acontecendo desde junho deste ano.

Ainda assim, a família tem dificuldade3 betsarcar com as despesas da casa, que aumentaram nos últimos dois anos. Por causa das complicações da pequena, os gastos no supermercado cresceram e a conta3 betságua mais que dobrou. A pele3 betsSofya descama, arde e, por isso, ela toma vários banhos por dia.

Simone, que até o ano passado era auxiliar3 betsserviços gerais, o marido, que trabalha3 betsuma fábrica3 betsrações, e o filho3 bets15 anos também vêm apresentando problemas3 betssaúde, mas só a menina frequenta a rede particular. "A gente precisa escolher quem vai se tratar, e a prioridade é a Sofya."

Odete Cassiano (à direita) e os pais

Crédito, Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Legenda da foto, Pai3 betsOdete Cassiano (dir.) toma remédios para controlar surtos psicóticos que passou a ter após o incidente | Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Desde que mexeu na lama nos dias seguintes ao desastre, o marido tem uma ferida na mão. Mesmo com o uso3 betsmedicamentos receitados pelos médicos da UPA, ela não cicatriza.

Simone faz acompanhamento psicológico na rede pública. Em uma noite do ano passado, conta, enquanto estudava para as provas da faculdade3 betsartes visuais - o caminho que encontrou para buscar um salário melhor -, ela teve um surto.

"O barulho3 betsconstrução não parava. Eles estavam trabalhando3 betstrês turnos. A cidade inteira parecia um canteiro3 betsobras. Eu tava cansada, tinha a Sofya... simplesmente levantei e atirei o computador no chão", conta.

Ela começou a trabalhar neste ano como professora3 betsartes3 betsuma escola municipal3 betsAcaiaca, cidade vizinha.

Um ano com lama no quintal

Risperidona, nortriptilina, clonazepam. O pai3 betsOdete Cassiano toma diariamente um coquetel3 betsmedicamentos para evitar os surtos episódicos3 betsque saía na rua gritando que queria ir embora3 betsBarra Longa.

Sua casa, na beira do rio Carmo, afluente do Doce, está entre aquelas que foram diretamente afetadas pela lama que invadiu a cidade3 bets2015. Ela entrou pelo quintal e subiu um metro e 73 centímetros do porão.

Carregada3 betsentulho e3 betstudo o que conseguiu arrastar desde a barragem Fundão, a dezenas3 betsquilômetros, a lama tinha, ela lembra, um cheiro forte e desagradável. "Nos primeiros dias a gente teve irritação na pele, calombo, queda3 betscabelo, dificuldade para respirar", conta a aposentada.

O quintal3 betsOdete, dois anos após o desastre

Crédito, Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Legenda da foto, Quintal dos Cassiano, que era repleto3 betsárvores frutíferas, foi arruinado pela lama com rejeito3 betsminério | Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

A lama passou um ano e um mês nos fundos da casa, antes3 betsser removida. Hoje limpo, o quintal3 betsCassiano - que viveu 34 anos na roça e se aposentou como produtora rural - era carregado3 betsárvores frutíferas: uma mangueira, um abacateiro, pés3 betsmexerica,3 betslichia. "O quintal era a diversão minha e do meu pai."

Ela também cuida da mãe, que, além3 betsfibrose pulmonar, passou a ter momentos3 betsagressividade, chegando a mordê-la, e hoje toma fluoxetina, um antidepressivo. Uma3 betssuas netas, que mora3 betsBelo Horizonte e que a visitava quase todos os fins3 betssemana, teve pneumonia quatro vezes no último ano. Ela não vai mais a Barra Longa.

"Se eu tivesse condições3 betssair daqui, sairia", diz.

Imóvel histórico carrega faixa com reclamações sobre reparos feitos pela empresa | Crédito: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Crédito, Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Legenda da foto, Moradores reclamam3 betsreparos feitos pela Samarco3 betscasas e prédios históricos3 betsBarra Longa | Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Em reforma

Além dos problemas3 betssaúde, a aposentada se queixa da qualidade dos reparos feitos pela empresa em3 betscasa, que ganhou rachaduras na sala por causa do impacto da lama sobre a estrutura.

Ela conta que, depois3 betsfeito o conserto, que deixou uma grande mancha branca no meio3 betssua parede lilás, a equipe comunicou que faria o acabamento apenas na área recuperada. "Eu botei todo mundo pra fora na mesma hora. Onde já se viu? Eles vão ter que pintar a parede inteira".

"Tudo é fonte3 betssofrimento, é a questão da saúde, é o combinado não realizado, a cor do piso que não tinha sido combinada", pondera a psicóloga Diana Jaqueira Fernandes.

Ela se mudou3 betsagosto do ano passado3 betsSão Paulo para Barra Longa, onde permaneceu até dezembro, para fazer a pesquisa3 betscampo3 betssua tese3 betsdoutorado. O estudo falará sobre o trauma psicossocial decorrente do desastre.

A pesquisadora destaca que a desigualdade social tem um papel importante3 betstragédias como a que aconteceu no entorno3 betsMariana.

Os mais pobres, ela afirma, são os que têm menos recursos para gastar com a saúde física e mental e para lidar com questões3 betsordem prática que, muitas vezes, precisariam da orientação3 betsum advogado. "Essas famílias sofrem muitas violências".

O prefeito Elísio Pereira Barreto (PMDB) estima que 70 imóveis restaurados pela Renova precisam3 betsnovos reparos. Em seu primeiro cargo público, que assumiu3 betsjaneiro deste ano, ele afirma que o trânsito intenso3 betsveículos pesados no último ano danificou trechos do pavimento, que precisaria ser recapeado, e diz que o ritmo3 betsreconstrução da cidade desacelerou nos últimos meses.

Parque3 betsexposições3 betsBarra Longa

Crédito, Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Legenda da foto, Em obras, parque3 betsexposições permanecerá sobre rejeito, que foi aterrado | Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil
Praça3 betsBarra Longa

Crédito, Foto: Camilla Veras Mota/BBC Brasil

Legenda da foto, Parte da lama foi aproveitada para fabricar os bloquetes que estão3 betsalgumas ruas e na praça3 betscidade mineira

Barra Longa chegou a ter entre 800 e mil trabalhadores mobilizados para a operação - número que, segundo ele, caiu para próximo3 bets100.

Um dos locais que segue3 betsobras é o campo3 betsfutebol e o parque3 betsexposições, ambos na saída da cidade. O parque3 betsexposições chegou a ser usado como depósito temporário da lama que vinha sendo retirada da cidade.

Em agosto do ano passado, a Samarco foi multada3 betsR$ 1 milhão pelo Ibama por omitir essa informação3 betsdocumento oficial. Após a aprovação do plano3 betsremoção3 betsrejeitos apresentado por ela, foi decidido que o material seria aterrado e coberto por uma camada3 betsareia.

A lama também foi usada para recobrir parte das ruas e da praça principal. Em duas fábricas nas proximidades3 betsBarra Longa, diz Waack, ela foi transformada nos bloquetes que foram usados nas obras. "É positivo encontrar alternativas, deixar o rejeito onde ele está quando é possível. Ele é inerte."