'Minha professora é diferente, e ela é maravilhosa': a trajetória da educadora com Down alvoaposta de jogos betspreconceitoaposta de jogos betsdesembargadora:aposta de jogos bets

Crédito, Rodolfo Seabra/Complexo EDH
'O que será que essa professora ensina a quem?'
As vidas da professora e da desembargadora se cruzaram há cercaaposta de jogos betstrês anos, quando Marília Castro Neves postouaposta de jogos betsum grupoaposta de jogos betsmagistrados no Facebook um comentárioaposta de jogos betsque dizia ter ouvido no rádio que o Brasil é "o primeiro país a ter uma professora portadoraaposta de jogos betssíndromeaposta de jogos betsDown".
Na mensagem, ela declarou: "(…) Aí me perguntei: o que será que essa professora ensina a quem? Esperem um momento que eu fui ali me matar e já volto, tá?".
O teor da publicação só viria a públicoaposta de jogos betsmarço deste ano, depois que a juíza fez comentários ofensivos e com informações falsas contra a vereadora Marielle Franco (PSOL), então recém-assassinada a tiros na região central do Rioaposta de jogos betsJaneiro.
"Me senti machucada", contou Débora à BBC Brasil. "Doeu o preconceitoaposta de jogos betsdizerem que sou incapazaposta de jogos betsdar aula."

Crédito, Reprodução/Facebook
O caso foi parar no Conselho Nacionalaposta de jogos betsJustiça (CNJ) após denúncia feita pela Federação Brasileira das Associaçõesaposta de jogos betsSíndromeaposta de jogos betsDown. Se somou a outros quatro ajuizados contra a desembargadora por causaaposta de jogos betssuas polêmicas postagens nas redes sociais. Todos tramitamaposta de jogos betssegredoaposta de jogos betsJustiça – o órgão diz não poder dar esclarecimentos sobre o andamento dos processos.
Em tese, o prazoaposta de jogos betsdefesaaposta de jogos betsNeves no CNJ terminaria nesta quarta-feira – mesmo diaaposta de jogos betsque ela postou no Facebook o pedidoaposta de jogos betsdesculpas à Débora e "à memóriaaposta de jogos betsMarielle".
O texto foi publicadoaposta de jogos betsseu perfil nas redes sociais, onde postagens mais recentes, inclusive essa, são fechadas e, portanto, visíveis somente a amigos. Acabou noticiado pela colunista Mônica Bergamo, do jornal Folhaaposta de jogos betsS. Paulo, mas não foi e nem será enviado diretamente a Débora ou à família, segundo confirmou à BBC Brasil um assessor do gabinete da desembargadora. "A divulgação que existe é esta."
Procurada pela reportagem, a magistrada não quis dar entrevista. A famíliaaposta de jogos betsDébora também preferiu não fazer comentários sobre a carta.
'Tenho o que ensinar'
Marília Castro Neves escreveu 386 palavras. Em meio a elas, diz que "tem sofrido muito" desde que foi "atropelada" pela divulgaçãoaposta de jogos betscomentários que fezaposta de jogos betsgrupos privados, alguns dos quais "há tanto tempo" que ela já "nem lembrava deles".
Diante da "repercussão imensa", ela diz que decidiu se recolher, chorou e pensou muito. E acrescenta: "Eaposta de jogos betstudo que li e ouvi ao meu próprio respeito, foiaposta de jogos betsvocê,aposta de jogos betsquemaposta de jogos betsum primeiro momento duvidei da capacidadeaposta de jogos betsensinar, que me veio a maior lição: aaposta de jogos betsque precisamos ser mais tolerantes e duvidaraposta de jogos betspré-conceitos".
"Perdão, Débora, por ter julgado, há três anos atrás, (...) que uma professora portadoraaposta de jogos betssíndromeaposta de jogos betsDown seria incapazaposta de jogos betsensinar. Você me provou o contrário."
Débora havia publicado no Facebook, aindaaposta de jogos betsmarço, uma carta-resposta ao questionamento da desembargadora.
Pegou lápis, uma folhaaposta de jogos betscaderno e o "choque" que sentiu, como contou à BBC Brasil. E então escreveu o que chamouaposta de jogos bets"Recado para a juíza Marília". No texto, detalha suas atividadesaposta de jogos betssalaaposta de jogos betsaula e afirma "ensinar muitas coisas" às crianças.

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"A principal é que sejam educadas, tenham respeito pelas outras, aceitem as diferençasaposta de jogos betscada uma e ajudem a quem precisa mais."
Quando terminou, "sentiu um alívio".
"Pensei que tinhaaposta de jogos betsresponder logo. Tenho o que ensinar às crianças e a todo mundo."
'Insegurança desnecessária'
Débora cursou magistério e, logo depoisaposta de jogos betsformada, foi chamada para ser auxiliaraposta de jogos betsdesenvolvimento infantil na escola onde havia estudado – uma das mais tradicionais na rede privadaaposta de jogos betsNatal (RN).
Treze anos atrás, quando pôs os pésaposta de jogos betsuma salaaposta de jogos betsaula pela primeira vez na nova função, o sentimento entre pais e professores eraaposta de jogos bets"insegurança", admite a diretora geral da instituição, Lucila Ramalho.
"É que foiaposta de jogos betsfato quebrar uma barreira. Nunca havíamos tido uma auxiliar com necessidades especiais", diz. "Mas foi uma insegurança desnecessária e que foi se dissipando. A síndromeaposta de jogos betsDown não atrapalha a prática dela. E ela conquista muito a criança."
Sandra Nicolussi,aposta de jogos bets52 anos, a primeira professora a quem Débora auxiliou, ficou "receosa", mas "se surpreendeu". "Ela precisavaaposta de jogos betstempo para aprender, mas foi se apropriando da rotina e mostrou que dava conta."
Débora atua hojeaposta de jogos betsuma turma do 4º nível, com cercaaposta de jogos bets20 alunos na faixa dos cinco anosaposta de jogos betsidade. Faz dupla com outra auxiliar encarregada, assim como ela,aposta de jogos betsdar assistência às atividades definidasaposta de jogos betsplanoaposta de jogos betsaula e coordenadas por uma pedagoga.

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Nessa função, é uma das mãos que ajudam a abrir os livros e a conduzir as crianças ao parque e ao banheiro, assim como os olhos que leem e a boca que conta histórias, "de preferência sobre animais e contosaposta de jogos betsfadas".
"Eu ajudo a educar e a incluir todo mundo", descreve ela. "Ensino que eles não podem brigar, que precisam dividir brinquedos, materiaisaposta de jogos betsaula e aceitar todas as crianças como elas são."
Débora diz que "se apaixonou por crianças". "Porque elas trazem alegria para a gente."
Ela encontrou reciprocidade no caminho.
Cinco anos atrás, a professora Laísa Palhano Torres,aposta de jogos bets47 anos, ouviu a filha, Rebeca, dizer surpresa: "Sabe, mamãe, tem uma professora diferente na minha sala. E ela é maravilhosa."
A menina tinha seis anos. "E acabou vendo o belo, por meioaposta de jogos betsdiferenças. Viu que não é preciso ter um susto dianteaposta de jogos betsum cadeirante,aposta de jogos betsum autista, ou da professora com síndromeaposta de jogos betsDown. Que é parte da vida", diz a mãe.
Na salaaposta de jogos betsaula, Débora vira a "tia Débora" – Ana Júlia, uma das alunasaposta de jogos betssua turma neste ano, capricha na entonação para contar sobre ela à mãe, a servidora federal Juliana Vieira Costaaposta de jogos betsAguiar,aposta de jogos bets34 anos.

Crédito, Frederico Seabraaposta de jogos betsMoura
Livroaposta de jogos betsfábulas
Da experiênciaaposta de jogos betscontar histórias aos alunos, Débora passou também a escrevê-las. Em 2010, trabalhou às escondidasaposta de jogos betsseu quarto, criando histórias e personagens. E no Natal daquele ano, entregou um manuscrito, depois transformadoaposta de jogos betslivro, como presente aos pais.
"São pequenas fábulasaposta de jogos betsque a preocupação central é sempre a compreensão, a empatia e a convivência cordial e afetuosa com os diferentes", descreveu o escritor João Ubaldo Ribeiro no prefácio.
Nas histórias que concebeu, uma menina, Sandra – uma homenagem à primeira professora que auxiliou – viveaposta de jogos betsuma fazenda onde ajuda a resolver conflitos entre os animais e a disseminar a mensagemaposta de jogos bets"sim à inclusão" e "não ao preconceito".
Por meioaposta de jogos betsseus ensinamentos, um cachorro e um papagaio aprendem a conviver com as diferenças e se tornam amigos, um coelhinho preto se dá contaaposta de jogos betsque não precisa ter pelos brancos para conquistar espaço e uma galinha surda, então isolada, aprende a se comunicar. E por aí vai. "É um pouco da história dela", diz a mãeaposta de jogos betsDébora, a advogada e procuradora aposentada Margarida Seabraaposta de jogos betsMoura.
Na fábula, um passarinho perdido é encontrado ferido. Ele voa então mais devagar e os outros questionam se não ficaria mais seguro se permanecesse na gaiola, sempre.
Sandra, a menina da fazenda, discorda. "Já pensaram se eu proibisse vocêsaposta de jogos betsvoarem para onde quisessem?", pergunta. "Tentem conviver com ele, aceitando o seu jeitoaposta de jogos betsvoar mais devagar. Ele voa com uma asa só, mas consegue ir para onde vocês vão e chegar lá como vocês chegam."

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Trinta e seis anos atrás, pouco tempo após a professora e escritora nasceraposta de jogos betsNatal, ela estavaaposta de jogos betsSão Paulo com a família quando o cartunista mineiro e amigo dos pais dela, Henfil, vaticinou: "Débora, você é tão forte quanto eu e vai fazer coisas inimagináveis".
Poucos meses antes, o pai dela, o psiquiatra José Robério Seabraaposta de jogos betsMoura, acompanhava o parto da filha quando viu o pediatra levar o bebê rapidamente para uma sala ao lado. Foi quando a família soube da síndromeaposta de jogos betsDown – uma alteração genética sobre a qual, no pouco que se falava, parecia conter prognósticos assustadores.
Todos ficaram, afirma, "em choque", mas a "aceitação" veio. "E já que o coração é sempre o órgão eleito para essas coisas,aposta de jogos betsrepente ela estava ocupando o lugar dela, dentro da gente", diz Robério.
Dentro deles e no mundo.
Débora foi à escola – sempreaposta de jogos betsinstituições regulares –, cresceu estampando páginasaposta de jogos betsjornal ou falandoaposta de jogos betsprogramasaposta de jogos betsTV locais e nacionais sobre inclusão, mas não parou por aí.

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Ela fez palestrasaposta de jogos betsseminários eaposta de jogos betsoutros eventos dentro e fora do Brasil –aposta de jogos betsPortugal, na Argentina e na 3ª Conferência do Dia Internacional da Síndromeaposta de jogos betsDown, na sede das Nações Unidasaposta de jogos betsNova York, nos Estados Unidos, onde ressaltou que "a inclusão começa na família, começaaposta de jogos betscasa", mas também passa pelos amigos e pelo trabalho. Também recebeu,aposta de jogos bets2015, o Prêmio Darcy Ribeiro, concedido pela Câmara dos Deputados a pessoasaposta de jogos betsdestaque na área da educação.
O irmão dela, o advogado Frederico Seabra, um ano e meio mais velho, a define como a "antifrágil".
"Eu acho que Débora é o contrárioaposta de jogos betsfrágil. Ela sente o preconceito quando acontece, mas cresce. Consegue dar respostas fortesaposta de jogos betscada situação e sair bem disso."
Ele estava na salaaposta de jogos betsesperaaposta de jogos betsuma clínica onde faria exames quando chegou uma mensagem da mãe pelo WhatsApp: "Você viu o que Débora fez?" Era uma foto da carta que a professora escreveuaposta de jogos betsresposta à desembargadora. A família então perguntou a ela se queria mesmo publicar. Ela quis. E assim fez.
"Ela sabe se defender. É advogadaaposta de jogos betssi mesmo", diz Frederico.

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Quando Débora nasceu, a expectativaaposta de jogos betsvidaaposta de jogos betsquem tinha síndromeaposta de jogos betsDown eraaposta de jogos betsaté 20 anosaposta de jogos betsidade, diz o geneticista e pediatra Zan Mustacchi, especialista na área há 40 anos. "Agora giraaposta de jogos betstornoaposta de jogos bets60 a 70 anos", explica.
Essa não foi a única mudança ocorrida com o tempo. "As pessoas com síndromeaposta de jogos betsDown eram marginalizadas com mais frequência no passado, mas era o medo que as pessoas tinham do desconhecido, havia menos divulgação na mídia sobre o assunto e menos oportunidades sociais eaposta de jogos betsacesso à saúde", diz.
"Ainda existem estereótipos, mas isso está mudando."
Segundo o Ministério da Saúde, cercaaposta de jogos bets300 mil pessoas no Brasil têm a síndrome, também conhecida como Trissomia 21,aposta de jogos betsreferência ao cromossomo 21, presente nesses indivíduos.
A síndrome é uma alteração genética que afeta 1aposta de jogos betscada 800 recém-nascidos e é resultadoaposta de jogos betsuma falha na divisão celular do óvulo ou do espermatozoide antes da concepção da criança. Com isso,aposta de jogos betsvezaposta de jogos betster 46 cromossomos – como a maior parte da população –, ela nasce com 47.
O paiaposta de jogos betsDébora brinca que um dos cromossomos dela é o que a torna resistente e persistente para ir atrás do que quer e defender suas bandeiras.
"Eu não desisto dos meus sonhos", ela diz. Dos planos também não. E os que temaposta de jogos betsmente, revela, são "casar e continuar sendo professora até se aposentar".
"Mas a aposentadoria ainda está longe."










