Como Monteiro Lobato transformou crítica social usando 'Jeca Tatu'6 bet pagasucesso literário:6 bet paga

Monteiro Lobato na década6 bet paga1920

Crédito, Domínio público / Wikimedia Commons

Legenda da foto, 'Jeca' é hoje um termo pejorativo, mas o personagem criado por Monteiro Lobato tinha o objetivo6 bet pagacriticar políticas6 bet pagagoverno

Urupês é focado no personagem principal, o Jeca. O nome da obra é inspirado no urupê - um tipo6 bet pagacogumelo parasitário que destrói a madeira -, e o Jeca Tatu é descrito como um caipira indolente, desleixado, sempre6 bet pagacócoras e pés descalços, nenhuma educação, cultura, ambição ou mesmo disposição para melhorar6 bet pagavida. Vive do que a natureza derrama aos seus pés e flerta o tempo todo com a preguiça, a cachaça e as crendices populares.

Capa original do livro Urupês

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, O 'urupê' era um tipo6 bet pagacogumelo que danificava a madeira. Na imagem, a capa original do livro6 bet paga1918

Jeca Tatu é o homem do campo real, que leva uma vida miserável nos rincões brasileiros e é praticamente ignorado pelos governantes. É lembrado pelos políticos apenas no momento do voto nas eleições. "O fato mais importante da6 bet pagavida é votar no governo. (...) Vota. Não sabe6 bet pagaquem, mas vota. Esfrega a pena no livro eleitoral, arabescando o aranhol6 bet pagagatafunhos e que chama 'sua graça''', diz Lobato,6 bet pagaum dos trechos do livro.

"Pobre Jeca tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade", completou Lobato, distanciando-se da figura romantizada que havia do interior do país e os seus moradores, muito cultuada nas rodas literárias nas primeiras décadas do século 20. Nessa época, era comum escritores e estudiosos cultuarem uma vida caipira sem problemas, marcada pelo contato com a natureza e distante do cotidiano real vivido na zona rural.

"Lobato lança um olhar crítico e ácido sobre a realidade brasileira, algo incomum entre os escritores da6 bet pagaépoca. É muito importante celebrar o centenário dessa obra demolidora, que questiona valores e não deixa pedra sobre pedra no panorama da literatura do século 20", afirma a jornalista Marcia Camargos, biógrafa6 bet pagaLobato e coautora6 bet pagaMonteiro Lobato: Furacão na Botocúndia (Edições Senac).

A redenção do personagem pelo seu criador viria pouco depois6 bet pagaoutro livro, a coletânea Problema Vital, também6 bet paga1918, onde Lobato reúne uma série6 bet pagaartigos escritos para a imprensa e afirma categórico: "O Jeca não é assim; está assim", deixando claro que o estado lastimável6 bet pagaque se encontrava o caipira era culpa do descaso das autoridades públicas.

Carta6 bet pagaMonteiro Lobato a Lima Barreto

Crédito, Acervo da Biblioteca Nacional / reprodução

Legenda da foto, 'O Brasil é a terra onde o certo dá errado, e o errado dá certo', diz Monteiro Lobato ao escritor Lima Barreto numa carta6 bet paga1918, ano da edição6 bet paga'Urupês'.

"Há no Jeca uma mudança contínua, que evolui6 bet pagaacordo com a conscientização6 bet pagaLobato a respeito das péssimas condições6 bet pagavida do povo. Jeca é um símbolo, ele encarna o trabalhador brasileiro, sempre no lado mais frágil na luta6 bet pagaclasses", explica Marcia Camargos, que possui pós-doutorado6 bet pagaHistória pela USP.

Outros personagens criados por Lobato posteriormente, como o Zé Brasil,6 bet paga1947, reforçam essa tese. "Em toda a obra adulta dele percebemos um crítica muito forte à política brasileira. Estamos6 bet pagaum momento político que torna muito oportuna a releitura6 bet pagaUrupês", completa a professora do Mackenzie, referindo-se às eleições6 bet pagaoutubro.

Ao editar e imprimir Urupês por conta própria na Revista do Brasil, que comprou com o dinheiro da venda da Fazenda Buquira e transformou6 bet pagauma grande editora nacional, Lobato também praticamente inaugurou o mercado editorial no Brasil. Até então, grande parte dos livros era impressa na Europa.

Um 'best-seller' internacional

Desde o seu lançamento, Urupês foi um sucesso estrondoso: mais6 bet paga30 mil exemplares vendidos6 bet pagasucessivas edições até 1925, sendo também traduzido para o espanhol e inglês. Em 1919, Jeca Tatu foi citado6 bet pagadiscurso6 bet pagaRui Barbosa durante6 bet pagacampanha presidencial. "Por tudo isso, podemos perceber a força e a vitalidade desse livro, que veio remexer as águas mornas do então mercado editorial nacional", diz Marcia Camargos.

Marcia Camargos

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, O livro não foi apenas um sucesso literário, mas também um sucesso6 bet pagapúblico, diz a especialista Marcia Camargos

"Além da novidade6 bet pagacenário e6 bet pagapersonagens, os contos6 bet pagaUrupês são narrados6 bet pagauma linguagem coloquial e cheia6 bet pagalances6 bet pagaoralidade. É como se o leitor 'ouvisse' alguém contando histórias", explica Marisa Lajolo, sobre o sucesso da obra nos anos seguintes ao seu lançamento.

Até morrer,6 bet paga1948, Lobato abraçou diversas causas nacionalistas, como a campanha do petróleo, e lançou diversos livros adultos e infantis. Sua obra mais conhecida do público juvenil é Narizinho Arrebitado, lançado6 bet paga1921 pela Monteiro Lobato & Cia Editora e que deu início à turma do Sítio do Picapau Amarelo. Lobato tornou-se um dos escritores mais consagrados da história da literatura infantil e juvenil brasileira.

Atualmente, Urupês é editado pela Editora Globo, que prepara uma edição especial para ser lançada até o fim do ano. No ano que vem, toda a obra do escritor cai6 bet pagadomínio público e deve ser relançada por outras grandes editoras.

Uma nova biografia juvenil6 bet pagaLobato também está sendo preparada por Marisa Lajolo junto com a historiadora Lilia Schwarcz. A previsão é que obra seja lançada6 bet paga2019 pela Companhia das Letras. "Será um livro bastante divertido, pois será como se ele contasse a vida dele. Apresentaremos Lobato como uma grande figura, e não como um nerd", adianta Marisa.

Ela revela aspectos curiosos e poucos conhecidos do escritor6 bet pagaTaubaté que estarão no novo livro, como o fato dele nunca ter sido bom aluno e adorar sentar junto com a "turma do fundão" nas aulas do colégio. Isso não o impediu6 bet pagatornar-se um intelectual respeitado, autor ídolo das crianças, precursor da indústria editorial nacional e autor da célebre frase: "Um país se faz com homens e livros".