Como ser 'top': Ubers viram youtubers e faturam ensinando segredo do sucesso a motoristas e entregadores:cbet india

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Pedro Roseno tem um canal com 20 mil inscritos, onde posta vídeos com dicas e conselhos para entregadores

Em um canal com 23 mil inscritos, Pedro Roseno posta vídeos sobrecbet indiarotina como entregadorcbet indiaaplicativo, o que faz algumas noites por semana. Nas imagens, mostra seu trajeto, dá dicas sobre o serviço e exibe seus ganhos por hora. Mesmo com algumas críticas às tarifas ou aos riscos sofridos, o tom écbet indiaelogio. A lógicacbet indiasua fala é simples: o trabalho é fácil, a entrada é rápida e, no fim, o sucesso só dependecbet indiavocê.

"Falo que dá pra tirar até R$ 3 mil só com app", ele diz, balançando na cadeira.

"Tem pessoas que eu conheço que ganham isso. Um colega que trabalha na zona lestecbet indiabike tiracbet indiaR$ 100 a R$ 120 por dia."

Do sofá, a reportagem pergunta quantas horas seu colega trabalha.

"Ele sai às dez da manhã e volta à meia-noite."

No Brasil, maiscbet india5,5 milhõescbet indiapessoas estão cadastradascbet indiaaplicativoscbet indiaentrega e transporte, segundo o Institutocbet indiaPesquisa Locomotiva. Com 12,6 milhõescbet indiadesempregados, como apontaram os dados mais recentes do IBGE, e cada vez mais gente nas plataformas, surgiram dezenascbet indiacanais no YouTube pensados para esse público. Os mais populares têm maiscbet india400 mil inscritos e dão origem a negócios como cursos e lojas virtuais.

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Em seu quarto-sala, Pedro edita os vídeos que compartilha com seus milharescbet indiaseguidores

Alémcbet indiaum começo parecido - tirar as dúvidascbet indiaquem quer entrar nos apps -, os canais têmcbet indiacomum o discurso motivacional, presentecbet indiacada cena: seja seu próprio chefe, escolha seu horário e ganhe pelo seu esforço. Os princípios são os mesmos anunciados por empresas do setor, como Uber e iFood,cbet indiapeças publicitárias.

"Os pontos negativos são poucos, na verdade", diz Pedro, enquanto pega capacete e câmera para saircbet indiacasa.

"O que as pessoas querem é uma formacbet indiaganhar dinheiro. Então quando você lança um vídeo dizendo que entrega dá dinheiro e é fácil, querem ver isso", ele continua, no mesmo tom.

Pedro acopla a GoPro no capacete rosa com estampacbet indiaflores e coloca a mochila verde-limão nas costas. Explica que é melhor não ligar o app antescbet indiatrancar a porta, porque, assim que o pedido tocar, terá seis minutos para chegar ao restaurante ou será bloqueado por meia hora.

"Tem que ir logo."

O portãocbet indiaferro é fechado rapidamente e, com a mesma agilidade, o celular se encaixa no suporte e o motor começa a roncar.

Pedro acelera pelas ruascbet indiaSão Paulo. São 21hcbet indiasexta-feira.

Faça seu próprio horário

Três pessoas trabalhamcbet indiauma filacbet indiacomputadores num escritório na zona sulcbet indiaSão Paulo. No canto esquerdo, há uma pequena salacbet indiareuniões, e, nas paredes, post-its coloridos dividem as tarefas por fazer,cbet indiaandamento e concluídas. Ali também estão a repórter da BBC e Marlon Luz, que apresenta partecbet indiasua equipe. O primeiro da fila é o desenvolvedorcbet indiaum aplicativo para motoristascbet indiaaplicativo, o segundo cuidacbet indiauma loja virtual com produtos voltados para esse grupo e a terceira é a secretária, que nos oferece um cafécbet indiaseguida.

"Açúcar?"

Marlon Luz é o maior youtubercbet indiaUber do Brasil. Criado há quatro anos, seu canal, o Uber do Marlon, tem 532 mil inscritos. Encostado emcbet indiamesa, enquanto os funcionários voltam a digitar - apenas três dos 11cbet indiasua empresa -, ele lembra do seu começo na plataforma.

"A grande vantagem foi justamente o horário. Esse tipocbet indiaatividade veio bem a calhar."

Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Depois do canal, Marlon Luz diversificou seus negócios no mundo dos apps com loja virtual e cursos

Em 2015,cbet indiamulher procurava um emprego com flexibilidade para que pudesse pegar as crianças na escola. As vagas que encontrava tinham horário fixo, o que atrapalhava seus planos.

Foi então que ela, uma ex-taxista, e o marido souberamcbet indiauma companhia chegada há pouco ao Brasil no qual os inscritos poderiam trabalhar por quanto tempo quisessem. Marlon comprou um carro para que ela começasse no serviço e decidiu testar também. Fazia corridas à noite, depoiscbet indiasair do emprego como programador, para ganhar um extra.

Ao ser demitido no ano seguinte, passou a depender das corridas. Como tinha dúvidas e não encontrava respostas na internet, decidiu produzir seu próprio conteúdo.

"Tentei criar coisas que pudessem me dar um bom dinheiro e ajudar as outras pessoas, principalmente ajudar as pessoas", ele explica no escritório onde guarda amostras das mercadorias oferecidas aos parceiros - carregadores portáteis, protetorescbet indiabanco e bolsinhas térmicas para água. Vinte mil unidades das últimas foram vendidas até agora, ele diz. O preçocbet indiacada uma é R$ 59,90.

O principal produto, no entanto, é o curso Motorista TOP, que oferece desde 2016 e já teve maiscbet indiaquatro mil participantes. O preço das aulas não foi informado.

A ideia do treinamento, conta, é ensinar o segredo dos 15%cbet indiamotoristas que faturam maiscbet indiaR$ 25 por hora ou "que ganham bem",cbet indiaacordo com uma pesquisa feita por ele entre seus seguidores.

"Hoje existe competição. Se você abrir seu aplicativo vai ter, no mínimo, três ou quatro carros a um minutocbet indiadistância."

Quando fala para a câmera da BBC, repete as palavras algumas vezes, para que elas saiam da forma desejada. Ao se atrapalhar, sacode a cabeça, "não está bom assim", e começacbet indianovo, como se gravasse um dos seus vídeos.

"O que vai fazer alguém ser chamado como prioridade? Foram esses critérios que descobri."

No canal, continua, seu objetivo também é melhorar a performance dos seus seguidores. Alémcbet indiasugerir estratégias, como nos vídeos "Dirigir 12h por DIA fica MUITO MELHOR desse jeito" ou "Passageiro MUITO LONGE... O que FAZER?", busca informá-los sobre elementos que possam interferir no trabalho,cbet indiamudanças na fiscalização a novas formascbet indiatransporte. Há críticas eventuais às empresas, mas no fim tudo volta ao motorista: qual é a sua tática para contornar o problema?

Vídeo do canalcbet indiaMarlon Luz

Crédito, Reprodução Youtube

Legenda da foto, Em umcbet indiaseus envios mais populares, Marlon Luz compara ser motoristacbet indiaapp com outros profissões

Em seu notebook, ele abre o vídeo mais popular, destacado na primeira página do canal: "10 Profissões que ganham MENOS que um motorista Uber", como manobrista e atendentecbet indiatelemarketing. Na conta que faz, um parceiro com veículo alugado ganha entre R$ 2,1 mil e R$ 3 mil por mês.

De dentro do carro, estacionadocbet indiaalguma ruacbet indiaSão Paulo, o Marlon das imagens olha para cima, onde está a câmera. Ele mexe as mãos para pontuar as frases, que são bem articuladas para serem didáticas.

"Olha que interessante, o manobrista também está acostumado a dirigir o carro, né? (...) Enfim, ele trabalha o dia inteiro no volante e ele ganha,cbet indiamédia, R$ 1,3 mil, R$ 1,4 mil por mês. Se eu fosse manobrista, eu trocaria esse trabalho por motoristacbet indiaaplicativo", e dá um pequeno sorri.

É horacbet indiadeixar o escritório. Marlon nos levará ao Pontocbet indiaApoio Motorista Top, espaço criado por ele perto do aeroportocbet indiaCongonhas, para que colaboradorescbet indiaapps possam esperar por corridas e limpar o carro sem custo. Também podem fazer compras, se assim desejarem.

O trajeto dura vinte minutos. Logo o Pontocbet indiaApoio revela-se uma garagem cujas paredes estão pintadas num padrãocbet indiacuboscbet indiagelos azuis e onde uma dezenacbet indiacarros aguardacbet indiafila. Caminhamos entre eles enquanto Marlon cumprimenta motoristas e funcionários do lugar, com tapinhas nas costas e abraçoscbet indialado. Ao fundo, há uma pequena loja.

Ali, vendem-se balas sortidas por peso — para quem quer agradar os clientes com sabores diversos -, salgadinhos e apetrechos como sachês perfumados e as populares bolsas térmicas, expostoscbet indiaprateleiras.

"A bolsinha faz com que o passageiro avalie mais fortemente com cinco estrelas e perdoe uma perdida no GPS", ele explica.

Marlon Luz no pontocbet indiaapoio Motorista Top

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Maiscbet india20 mil bolsinhas térmicas para água já foram vendidas por Marlon emcbet indialoja virtual

A reportagem pergunta se a loja dá lucro, mas Marlon diz que ela apenas se sustenta. O que dá dinheiro, "mais do que ser um motoristacbet indiaaplicativo", é o YouTube, quecbet indiarazão da publicidade gera US$ 2 mil (cercacbet indiaR$ 8 mil) por mês. No total, informa depois, as empresas das quais é proprietário ou sócio geraram uma receita totalcbet indiaR$ 1,3 milhãocbet india2018. Em 2019, espera que o faturamento cresça 25%.

Ao voltarmos ao pátio, ele é abordado por um homem que se apresenta como Cleber,cbet indiacamisa social verde-clara. Com o celularcbet indiamãos, Cleber pede uma selfie.

Nem bem a foto é tirada, o visitante diz que entrou no aplicativo depoiscbet indiaassistir a Marlon.

"Seus vídeos são muito top!", ele sorri.

Conta que há oito meses decidiu deixar o emprego como operadorcbet indiaempilhadeira para trabalhar apenas com os aplicativos. Com carteira assinada, ganhava R$ 1,8 mil e agora faz R$ 2,8 mil limpos.

"Ótimo! Nada bate o resultado!", Marlon responde, devolvendo o sorriso.

"E tenho horário flexível!", Cleber emenda.

O youtuber pergunta quantas horas seu seguidor dirige por dia

"Ah, 12, 18", ele responde distraído, espiando a tela do smartphone.

"Pelo amorcbet indiaDeus, não faça isso não, cara", Marlon se apoia nos ombros do homem, e solta uma risada sem jeito.

Não tem problema, Cleber garante. Ele conhece os limites do seu corpo: come bem e vai para casa quando está com muito sono. As 18 horas se encaixam nacbet indiarotina - até combinou com a namoradacbet indiavê-la a cada duas semanas, quando tira o fimcbet indiasemanacbet indiafolga.

Marlo Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Marlon diz se considerar responsável pelas pessoas que influencia no YouTube

Antescbet indiachegar ao pontocbet indiaapoio, a reportagem da BBC havia perguntado a opiniãocbet indiaMarlon sobre a jornada dos motoristas.

"Cansa bastante", ele disse, num suspiro.

Quando perdeu o emprego, Marlon chegou a passar 80 horas por semana dentro do carro, o que era, sim, muito cansativo. No entanto, ponderoucbet indiaseguida, uma jornada diáriacbet india12 horas é viável. Ele mesmo trabalhacbet india14 a 15 horas entre todas as suas atividades, da loja virtual aos vídeos, passando pelas obrigações como vice-presidente da Associaçãocbet indiaMotoristascbet indiaAplicativocbet indiaSão Paulo. Às corridascbet indiaUber, dedica apenas quatro horas, para "manter uma ligação com seu público". Debaixocbet indiaseus olhos azuis, veem-se olheiras pretas.

A reportagem perguntou, então, se 12 horas não seria tempo demais.

"Não recomendo nenhum motorista a ficar mais do que isso", disse.

"Alguns países pedem para o aplicativo bloquear a conta do motorista depois desse período. Isso inibe a pessoacbet indiatrabalhar? Não, né. Porque ela vai para outro aplicativo. Não é uma lei muito eficiente", continuou, seu rosto coberto pela sombra do para-sol.

Doze horas lhe parecem um tempo máximo "OK".

"Mas tem pessoas que aguentam mais."

Entregador dá pacote a cliente

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Maiscbet india5,5 milhõescbet indiapessoas estão cadastradascbet indiaaplicativoscbet indiaentrega e transporte, segundo Instituto Locomotiva

Seja seu próprio chefe

Em um dos seus vídeos, chamado "FEZ O PEDIDO E NÃO TINHA R$ PRA PAGAR E AGORA?!", o youtuber Wesley Tavares, o Tavares 160, mostra a tensãocbet indiaum momento aparentemente simples: um cartãocbet indiacrédito que não passa.

"Senha inválida? Não, mas a senha é essa, moço", uma mulher diz, afinando a voz, os jeans aparecendo no canto inferior da cena, ao lado do tapetecbet indiauma lojacbet indiadepilação. Seu rosto está borrado.

Seguem-se outras tentativas, mas nenhuma dá certo. Se ela não conseguir pagar, o valor do pedido ficará como dívida na contacbet indiaWesley, que precisará entrarcbet indiacontato com iFood para explicar a situação.

"É, deu falha", ele diz.

A cliente pede ajuda a uma amiga, que empresta seu cartão. Um momentocbet indiaexpectativa antecede a mensagem: pagamento feito com sucesso.

Entregadores e motoristascbet indiaaplicativo não têm chefe. Ou pelo menos esse é um dos argumentos mais comuns na publicidade das empresas do setor e nas falas dos youtubers. Sem uma figura hierárquica, no entanto, perde-se a referênciacbet indiaquem procurar quando problemas aparecem. Se o pagamento falhar, quem é o responsável?

No vídeo, ao voltar para a moto, Wesley reclama da situação para seus 407 mil inscritos.

"Tipo assim, não vou saber qual é a senha dela, a maquininha tava aceitando o cartão e tava dando senha inválida. O problema não é meu, dei essa opção para ela, mas o certo é ligar para o suporte, né."

Em uma entrevista por telefone, o entregador, um dos maiores youtubers do nicho, fala mais sobre as dificuldadescbet indiacomunicação.

"Alguns suportes são rápidos. Mas no iFood, por exemplo, deixa muito a desejar, demora para responder e é mais por mensagem", explica.

"Muitos descontam o valor porque o cliente falou que não recebeu. Aí é tudo por email e tem que esperar eles retornarem. De repente, deu pau no app, constou que não foi entregue, se o cliente falou que não recebeu, não sei como você faz…"

Print da página do Tavares 160

Crédito, Reprodução YouTube

Legenda da foto, Tavares 160, um dos maiores youtubers do nicho, tem 407 mil seguidores

Procurado, o iFood informou que tem dois canaiscbet indiaatendimento: "o chat, que tratacbet indiasituações mais urgentes, e o ticket, que permite que eles tratemcbet indiaqualquer outro tema que não esteja relacionado ao pedidocbet indiaandamento".

Essa discussão não faz muito sentido, pondera Marcio Juvino, do canal Entregadorcbet indiaLanches, que tem 17,5 mil inscritos. Os motoboys nunca tiverem chefe, diz, e as empresas só incluíram essa vantagemcbet indiaseus anúncios. Foi justamente isso que o atraiu.

"Quem não quer fazercbet indiarotina? Dá a impressãocbet indiaque você tá mais livre."

Afinal, conclui, a escolha écbet indiacada um. Acbet indiafoi não largar o trabalho com carteira assinada na áreacbet indialogística e encarar as entregas como um extra. Conta que "não teve coragem"cbet indiapedir demissão, porque seria necessária alguma educação financeira para compensar as perdascbet indiaINSS, fundocbet indiagarantia e férias.

"Mas com planejamento, o cara consegue se manter tranquilo."

Ele é a favor que as empresas paguem o INSS dos parceiros, mas como isso não deve acontecer, aconselha que não deixemcbet indiacontribuir para a Previdência. Aos olhoscbet indiaMarcio, não dá para confiar nos aplicativos. Um dia você pode acordar e não conseguir mais logar - e o algoritmo não costuma dar explicações.

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"PROMOÇÃO para cidadecbet indiaSão Paulo! Hoje, todas as rotas entre 8:00 e 9:59 terão um adicionalcbet indiaR$ 4. Aproveite para ganhar mais!"

Enquanto Tavares e outros youtubers gravam seus vídeos, ficamcbet indiaolho na tela do celular. Em alguns apps, os parceiros têm um tempo determinado para chegar aos restaurantes antescbet indiao pedido passar para outros. Eles também recebem mensagens dos apps e perguntas dos clientes ao longo do dia.

"Oi, vai demorar muito?"

As falhascbet indiacomunicação parecem não valer para o lado das empresas. E não era isso que Mateus esperava.

Bombeiro civil, ele sempre trabalhou com carteira assinada e não gostavacbet indiaseguir uma hierarquia ou dar explicações quando chegava atrasado.

Depoiscbet indiaperder o emprego, há dois anos, pensoucbet indiacomeçar nos aplicativos. A promessacbet indiaganhar mais dinheiro foi o que lhe convenceu. Nacbet indiaantiga vaga, o salário eracbet indiaR$ 1,5 mil enquanto entregadores diziam fazercbet indiaR$ 3 mil a até R$ 8 mil por mês.

"Me seduziu", conta ao telefone.

Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Loja do Pontocbet indiaApoio Motorista Top,cbet indiapropriedadecbet indiaMarlon, vendecbet indiabalas sortidas a fonescbet indiaouvido

Desde então, as coisas mudaram. O chefe está mais presente do que imaginava, mas não como gostaria. Se o cliente não aparecer para receber o produto, Mateus deve levá-locbet indiavolta à central, sem receber nada pelos quilômetros rodados. Se reclamar, diz, pode ser bloqueado.

"É uma relaçãocbet indiafuncionário e patrão: ou me obedece ou vai sofrer as sanções, que é o desconto ou o bloqueio."

Esta não é uma percepção individual. Professores entrevistados pela BBC News Brasil mencionam a existênciacbet indiaum novo tipocbet indiachefe, sem rosto nem escritório, e que ainda exerce seu poder sobre os trabalhadores. Alguns o chamamcbet indiaalgoritmo.

As empresas responsáveis pelos aplicativos se apresentam como ferramentas que ligam oferta e demanda e por isso defendem não ter qualquer vínculo empregatício com seus parceiros. Mas como os parceiros disseram a reportagem, mesmo sem a figura formalcbet indiaum superior, o trabalho mantém exigências.

Essa contradição será percebida com o passar do tempo, argumenta o professorcbet indiasociologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e membro do grupo Trabalho, Trabalhadores e Reprodução Social da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Bruno Durães.

"Nenhuma formacbet indiatrabalho fica misteriosa durante anos", diz. "Mesmo que estejamos lidando com uma realidade inovadora, vivemos uma lógicacbet indiacontrole nunca antes vista. Com o algoritmo, há um controle sobre todos os detalhes do trabalho."

Protestocbet indiamotoristascbet indiaUbercbet indiaNova York

Crédito, Drew Angerer/Getty Images

Legenda da foto, Protestocbet indiamotoristas contra appscbet indiaNYcbet india2019; neste ano, lei que obriga Uber a contratar trabalhadores foi aprovada na Califórnia

O mistério a que Durães se refere começa a ser desvendadocbet indiaoutros países. Em setembro, a Assembleia Legislativa da Califórnia aprovou uma lei que obriga as empresas Uber e Lyft a contratarem seus motoristas como empregados. O texto deve entrarcbet indiavigorcbet indiajaneirocbet india2020.

No Brasil, a Justiça havia negado a existênciacbet indiavínculo empregatício entre parceiros e aplicativos até que,cbet indiaagosto do ano passado, a 15ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho,cbet indiaSão Paulo, a reconheceu no casocbet indiaum motorista da Uber. A relatora, desembargadora Beatrizcbet indiaOliveira Lima, afirmou que o homem não tinha verdadeira autonomia, porque precisava seguir as regras impostas pela empresa.

No entanto,cbet indiasetembro deste ano, o Superior Tribunalcbet indiaJustiça voltou a negar a existênciacbet indiaum vínculo trabalhista. Apesarcbet indiaa decisão corresponder a um processo específico e não ter aplicação automática a outros, ela pode servircbet indiaprecedente.

Enquanto isso, as companhias continuam sabendo tudo sobre seus colaboradores, lembra o professor Durães. O trajeto, o tempo, os desvios, a localização — detalhes a que nenhum superior jamais teve acesso. Basta que o aplicativo esteja ligado.

Ganhe pelo seu esforço

"Peraí que tão tentando ficar na minha vaga aqui, só um minuto", Mateus pede uma pausa na entrevista por telefone. Ao fundo, os barulhos do trânsitocbet indiaSão Paulo — buzinas, às vezes uma sirene, o ruído constante dos carros no asfalto.

"Eu já tava aqui, com licença, eu tava aqui antes…", ele diz para alguém.

A ligação é interrompida.

Quando atende o celular, vinte minutos depois, Mateus conta, a voz abafada, que se meteu numa discussão. Um motorista queriacbet indiavaga e o ameaçou dizendo ter uma faca.

"É como eu te falei", ele continua, sem mudar o tom. "No início, a Rappi chegou no Brasil com toda essa proposta: você é seu próprio chefe, faz seu horário, e tinha vários subsídios para encher os olhos dos empregados, mas isso não se sustentou."

Os ganhos já foram bons, conta Mateus. Ele chegou a tirar R$ 3 mil por mês, quando as promoções ajudavam a complementar a taxa das entregas. Nessa época, considerou os valores pagos justos, mas com o tempo eles foram diminuindo. Hoje, consegue entre R$ 1,2 mil e R$ 1,5 mil por dez horas na rua.

Segundo ele, no ano passado, a Rappi pagava uma taxa mínimacbet indiaR$ 8,90, valor que teria caído para R$ 4,20.

Questionada sobre as tarifas, a empresa não deu uma resposta objetiva, mas informou que:

"O valor do frete é calculado com basecbet indiadiversas variáveis, como clima, dia da semana, horário, zona da entrega, distância percorrida e complexidade do pedido, a fimcbet indiaproporcionar equilíbrio entre oferta e demanda."

Mateus demorou a perceber a queda nas tarifas, mas a certezacbet indiaque não poderia contar com os aplicativos veio rápido.

Na segunda semanacbet indiaentregas,cbet india2017, sofreu um acidente que lhe custou R$ 2,5 milcbet indiaconsertoscbet indiamoto, um susto e uma mensagem automática.

Como havia atendido poucos pedidos na plataforma até então, precisou voltar a trabalhar rápido — e por mais horas — para compensar o ocorrido. Foi um mês difícil.

"Precisei comer biscoito por semanas pra economizar. Mandei um email falando do acidente, mas eles disseram que sou MEI [Microempreendedor Individual] e não tenho vínculo nenhum. Era daquelas mensagenscbet indiarobô. A partir disso fui tomando consciência da relação que ia ter ali. Vi que era só eu."

Mateus não conhecia bem esse tipocbet indiatrabalho. Sempre teve carteira assinada e escreveu para a empresa na expectativacbet indiaque receberia algum amparo. Mesmo com a negativa, continuou online. Era a única opção, ele diz.

Grupocbet indiaWhatsappcbet indiaentregadorescbet indiaapp

Crédito, Reprodução Whatsapp

Legenda da foto, Em gruposcbet indiaWhatsApp, entregadores criticam abertamente os aplicativos

Os motoristas e entregadores entrevistados, alémcbet indiamembroscbet indiatrês gruposcbet indiaWhatsApp acompanhados pela reportagem, também falamcbet indiauma diminuição das tarifas e do númerocbet indiapedidos, o que levou a jornadas mais longas para ganhar o mesmo valor do começo.

"Esse negóciocbet indiaganhar dinheiro quando eu quisesse -cbet indiadia,cbet indianoite,cbet indiamadrugada - foi bom no início. Hoje sou obrigado a sair todo dia, porque senão não consigo me sustentar", diz Mateus.

Isaías não recebia um pedido havia cinco dias quando a reportagem lhe telefonou. Todas as manhãs durante as duas primeiras semanas como entregadorcbet indiaaplicativo pedalava quatro quilômetroscbet indiasua casa até um shoppingcbet indiaFortaleza, onde esperava por uma chamada, ao ladocbet indiaoutros ciclistas. O começo foi bom, mas depois tudo parou.

"Nos primeiros dias recebia uma médiacbet indiaseis, sete pedidos. Agora tô rodando e não chega nenhum. Tem outras pessoas que ficam no shopping e tão na mesma situação."

Desempregado há um ano, Isaías,cbet india20 anos, era auxiliarcbet indiacozinhar. Como estava difícil voltar para o mercado, seguiu o conselhocbet indiaum primo e foi a uma palestra do iFood. Hoje, levanta hipóteses para entender a faltacbet indiapedidos. Acha que pode ser culpacbet indiauma atualização do celular ou da concorrência.

"É muita gente para pouco serviço. Vejo muito entregador na cidade, principalmentecbet indiamoto."

Procurado, o iFood não respondeu se há um desequilíbrio entre o númerocbet indiapedidos ecbet indiaparceiros disponíveis:

"A empresa esclarece ainda que o númerocbet indiapedidoscbet indiacada parceirocbet indiaentrega é resultado da dinâmica do mercado local."

Com a multiplicação das mochilas verde-limão, rosas e vermelhas pelas cidades brasileiras, não é só Isaías que pensa haver gente demais nos apps. A tese é repetida por outros entrevistados:

Se maiscbet indiacinco milhõescbet indiabrasileiros estão inscritos nessas plataformas, há lugar para todos?

"É…", Marlon diz do outro lado da linha, na entrevista por telefone que antecedeu a visita a seu escritório. Para ele, as plataformas não paramcbet indiaaceitar colaboradores porque qualquer tipocbet indiaseleção ajudaria a comprovar um vínculo empregatício entre aplicativo e parceiro.

Segundo o youtuber, a superlotação não é um problema dos apps, mas do desemprego, "o grande vilão".

"O ideal é que tivesse menos motorista, mais gente com emprego."

Entre os milhões inscritoscbet indiaaplicativos, é possível distinguir alguns perfis. Há os que recorreram ao serviço por faltacbet indiaalternativa, os que têm trabalho, mas desejam reforçar a renda e os que largaram o emprego para tornarem-se apenas motoristas ou entregadores.

De acordo comcbet indiauma pesquisa feita neste ano pela Fundação Institutocbet indiaAdministração, escolacbet indianegócios fundada por professores do Departamentocbet indiaAdministração da USP, 53,8% dos 1,5 mil entregadores entrevistados não têm outra atividade profissional fora dos aplicativos. Deles, 44,3% não trabalhava com delivery antes.

Pedro Roseno

Crédito, Reprodução Youtube

Legenda da foto, Em vídeo chamado "Estou perdendo dinheiro?", Pedro diz que poderia ganhar mais se largasse o emprego fixo

"Vc é inspiração pra muita gente, eu tbm to querendo comprar minha moto minha vontade aumentou mais ainda quando vc comprou a sua, parabéns que Deus te dê muito mais coisas nacbet indiavida e obrigado pela inspiração!!!" foi o comentário que o usuário Isaac Blitz deixou no vídeocbet indiaque Pedro Roseno anunciacbet indiadecisãocbet indiasair do trabalho com carteira assinada para dedicar-se ao Uber Eats.

Em "Estou perdendo dinheiro", publicado há três meses, ele argumenta que o tempo gasto como funcionáriocbet indiaestacionamento é um desperdício, porque poderia ganhar mais se trabalhasse apenas com entregas.

Não é raro que pessoas escrevam para Pedro perguntando se também devem largar seus empregos.

No quarto-sala onde a lâmpada amarela mal ilumina seu rosto, Pedro estácbet indiasilêncio, os olhos voltados para cima.

"O que você diz a elas?" é a pergunta que a reportagem acaboucbet indiafazer.

"O meu objetivo é…", ele para. "Enquanto tá dando, vou largar o emprego. Por quê? Como o meu currículo é bom, eu posso mais na frente, se não der certo, procurar outro emprego", diz, com pausas nas vírgulas, como se a lógica do pensamento seguisse o ritmo da frase.

"Mas eu não aconselho ninguém a fazer isso. Que procurem outra coisa, estudar, um emprego melhor, porque o negócio é muito incerto."

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Pessoas querem uma forma fácil e rápidacbet indiafazer dinheiro, diz Pedro sobre seus vídeos

Usar os aplicativos como renda única não é a melhor alternativa, diz o professor do Insper David Kallas, especialistacbet indiaGestão Estratégica. Para ele, a conta não fecha. Se alguém que trabalha exclusivamente como motorista ou entregador colocasse seus gastos e ganhos na ponta do lápis, argumenta, dificilmente conseguiria trocarcbet indiacarro.

O professor diz que os apps funcionam quando são usados como complementocbet indiarenda, por duas ou três horas por dia. Essa seria uma opção viável para o modelocbet indianegócio.

"Mas aqui a grande entradacbet indiapessoas é reflexo do desemprego. Elas usam o plano B como plano A."

No Brasil, continua Kallas, a necessidade une-se à dificuldadecbet indiafazer contas. A maioria dos youtubers menciona gasolina, multas e impostos, mas poucos incluem a perdacbet indiavalor do carro e ninguém menciona o desgastecbet indiaquem dirige, o que pode levar a despesas com exames e remédios no futuro.

Cleber, que pediu a selfie com Marlon no pontocbet indiaapoio, saiu do empregocbet indiaR$ 1,8 mil para ganhar R$ 2,8 mil na Uber. Seu raciocínio é simples: agora tem mais dinheiro no bolso. No entanto, não citou o fundocbet indiagarantia que perdeu, alémcbet indiasuas férias e as contribuições previdenciárias. Fazia oito meses que trabalhava até 18 horas por dia.

"Por enquanto, está tudo certo. Meu corpo é forte", ele disse, confiante.

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Marlon não desenvolve apenas estratégicas para ajudar seus inscritos, como ele mesmo tira seu sustento dessas dicas. Todos os youtubers entrevistados fazem algum dinheiro com a produçãocbet indiaconteúdo.

Seus ganhos costumam vircbet indiaduas fontes: a monetização dos vídeos na própria plataforma e os códigoscbet indiaindicação. Motoristas e entregadorescbet indiaaplicativo recebem um código que podem passar a pessoas interessadascbet indiase cadastrar nos apps. Se essas pessoas se inscreverem e completarem um determinado númerocbet indiacorridas, o dono do código recebe um valor, que pode chegar a R$ 500, segundo relatos.

Não é estranho que depois do "Oi, motoras! Tudo bem?" do começo dos vídeos venha um recado como este: "e usem meu código aqui embaixo para se cadastrar!"

Print da telacbet indiacelular com o aplicativo Uber ligado

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Ex-youtuber diz que poderia ter ganhado maiscbet indiaR$ 67 mil ao divulgar códigocbet indiaindicação da Uber

Um ex-youtubercbet indiaentregas, que deixou os aplicativos ao conseguir um emprego formal, diz que chegou a ter maiscbet indiaR$ 70 mil para receber da Uber ao divulgar seu códigocbet indiaum vídeo. Gravadascbet india2017, as imagens somam hoje 102 mil visualizações. O entregador diz que não recebeu o dinheiro, porque a empresa informou que a divulgação do código feriria suas regras.

Procurada, a Uber respondeu com um link para seu regulamento. Um dos itens diz o código não pode ser anunciado publicamente.

Apesar da proibição, alguns dos maiores nomes do gênero continuam a usar esse recurso. Um deles, que não quis dar entrevista e por isso não será identificado aqui, tem maiscbet india450 mil inscritos e anuncia seu código a cada postagem. Depois do logocbet indiaentrada do canal, escuta-se a mesma gravação: "Trabalhe como entregador no aplicativo Uber Eats. Use meu código para se cadastrar na plataforma, link na descrição".

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Quando deixamos o pontocbet indiaapoio Motorista Top, já é fimcbet indiatarde. Preso no trânsito lento ao redor do aeroportocbet indiaCongonhas, Marlon fala sobre o encontro com Cleber, o rapaz que largou o emprego depoiscbet indiaassistir a seus vídeos.

"É muito comum eu ouvir 'virei motorista por tua causa!', esse tipocbet indiacoisa. O YouTube traz essa celebridade, mas para mim é um jeitocbet indiater um reconhecimento do trabalho. Tu viu o olhinho daquele Cleber, né?", ele pergunta, os seus aparecendo no retrovisor, orgulhosos. "Quando a pessoa vem e tá com aquele arcbet indiafelicidade por me conhecer presencialmente é porque eu inspirei elecbet indiaalguma forma."

A reportagem questiona se Marlon se sente responsável por pessoas como Cleber.

Ele abaixa o quebra-sol para proteger os olhos da luz alaranjada que invade o carro. O motorista continua encarando a filacbet indiafrente, dezenascbet indiaveículos movendo-secbet indiacâmera lenta, quando responde que, sim, bastante, e por isso oferece o melhor conteúdo possível, para que alcancem o sucesso.

E se não der certo? a BBC insiste. Passamoscbet indiafrente ao aeroporto, com táxis à espera e um entra e saicbet indiapessoascbet indiaoutros carros.

"Fico triste", ele fala, sem alterar a voz. "Mas sempre tento ajudar. Sou uma pessoa que gostacbet indiaajudar."

Liberdade, igualdade e flexibilidade

No banner expostocbet indiaum pontocbet indiaônibus, um homem negro abraçacbet indiaguitarra no que parece um bar vazio. Lê-se: "eu dirijo para me dedicar à música". Embaixo, um endereço: uber.com/dirija.

Liberdade, autonomia e individualidade são os principais conceitos por trás do discurso das empresascbet indiaplataforma. Em peças publicitárias, elas convidam possíveis parceiros a serem chefescbet indiasi mesmos, donos dos seus próprios horários, livres para escolher o quanto querem trabalhar, deixando tempo para outras partes da vida.

Mas não foi Uber, Rappi, iFood, 99 ou outras empresas do ramo que inventaram essas ideias.

Professorescbet indiasociologia do trabalho ouvidos pela BBC News Brasil apontam suas origens históricas, que começam na Escola Austríacacbet indiaEconomia, escolacbet indiapensamento econômico desenvolvida no final do século 19. Base do pensamento neoliberal, ela introduz a ideia da pessoa como empresacbet indiasi mesmo e, portanto, independente do Estado.

Publicidade da Ubercbet india2017

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Legenda da foto, Publicidade da Ubercbet india2017, anunciando vantagens do trabalho por app

"Para autores do neoliberalismo, o emprego é visto como uma prisão, porque impede que as pessoas desenvolvam suas capacidades e gerem riquezacbet indiacima disso", diz Bruno Cardoso, professor adjunto do Programacbet indiaPós-Graduaçãocbet indiaSociologia e Antropologia da Universidade Federal do Riocbet indiaJaneiro (UFRJ).

Conceitos como esses vêm mudando a forma como trabalhamos há pelos menos 40 anos.

O pontocbet indiamudança, explicam os entrevistados, foi o Toyotismo, um modocbet indiaprodução que sucedeu o Fordismo nas fábricas a partircbet india1970. Aplicado inicialmente no Japão, o sistema rompeu com a produçãocbet indiamassa e passou a produzircbet indiaacordo com pedidos já feitos. Dessa forma, tanto a matéria-prima quanto a mãocbet indiaobra serviam às necessidades do momento.

Para isso, o Toyotismo exigia flexibilidade dos trabalhadores. Ao contrário do Fordismo,cbet indiaque cada um realizava uma única função, no novo modelo o mesmo funcionário era responsável por várias tarefas. Assim, vieram também mudanças nos direitos dos empregados, com contratoscbet indiameio período, por exemplo, alémcbet indiaum aumentocbet indiaterceirizações.

Em paralelo a essas transformações, fortaleceu-se um discurso que ligava flexibilidade à liberdade, ao poder escolher, o que era um desejos dos trabalhadores da época, como explica a professora do Departamentocbet indiaPós-Graduação do Institutocbet indiaCiências Humanas da Universidade Federalcbet indiaJuizcbet indiaFora (UFJF) Ana Claudia Moreira Cardoso.

"Era um pedido real por autonomia e não só dos trabalhadores. É só pensarcbet indiamaiocbet india1968 na França. Toda a sociedade saiu à rua contra o autoritarismo, as relações verticais, contra não ter voz."

Se o Toyotismo começou nos anos 1970, no Brasil as mesmas ideias apareceram a partircbet india1980 e com forçacbet india1990, com uma resposta à queda nas vendas.

Segundo Cardoso, a novidade combinou com o posicionamento do movimento sindical, que reclamava da hierarquia na indústria.

"Foi criando-se essa concepçãocbet indiaque ser flexível é ter liberdade, autonomia. Flexibilidade, autonomia e participação acabaram tornando-se sinônimos, o que não era real porque ficou flexível para o empresário, que era mais forte, mas as desvantagens caíram para o lado do funcionário."

Trabalhadorcbet indiafábrica

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Legenda da foto, Mudanças nas fábricas inauguraram transformações no mercadocbet indiatrabalhocbet india1970

Mas como essas tendências chegaram aos aplicativos?

As mudanças nas fábricas e o avanço das máquinas, que substituíam cada vez mais gente, levaram a cortescbet indiavagas na indústria. Sem seus empregos, ex-operários buscaram trabalho no comércio e nos serviços, num processo que ficou mais intenso a partir dos anos 2000. Nessas áreas, muita mãocbet indiaobra humana ainda era necessária, porque a inovação era menor.

De acordo com os entrevistados, o que vemos hoje é uma combinação dessas modificações no mercadocbet indiatrabalho com uma sociedade cada vez mais digital. A internet, como diz a professora Cardoso, passou a mediar todas as relações, da educação à paquera, então usar aplicativos para trabalhar também tornou-se natural. É só mais uma possibilidade no smartphone.

Ao oferecer essa possibilidade, as empresascbet indiatecnologia se apropriam do discursocbet indiaque flexibilidade é igual a liberdade, inclusive para se definir não como empregadoras, mas apenas intermediárias entre alguém que demanda um serviço e outro que o oferece.

A ideiacbet indialigar pessoas com necessidades e ofertas compatíveis não é nova. Mas ela nasceu com intenções nobres, longecbet indiareceitas bilionárias.

Homem mexecbet indiacelular dentrocbet indiacarro

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Legenda da foto, Mudanças no mercadocbet indiatrabalho e discursocbet indialiberdade chegaram aos apps

Um artigo publicadocbet india2016 pelo centrocbet indiapesquisa da Comissão Europeia, órgão que representa os interesses da União Europeia, diz que esquemascbet indiacompartilhamentocbet indiacarros foram lançados pela primeira vezcbet indiaZurique, na Suíça,cbet india1948, pelas mãos dos cidadãos. Ideias como essa tornaram-se mais viáveis com a expansão da internet e popularizaram-se nos Estados Unidos nos anos 2000. Na época, elas ainda eram espontâneas, estabelecendo-secbet indiapessoa para pessoa.

"Em inglês, começou com o conceito do que é meu é seu. 'Tenho esse cortadorcbet indiagrama, não vou usá-lo, então você pode usá-lo'. Não tinha dinheiro envolvido, era uma relaçãocbet indiavizinhos, amigos, conhecidos", explica Tozi.

Para o professor, as empresas teriam cooptado a noçãocbet indiaeconomia solidária e imposto uma ordem vertical a uma relação que era horizontal, entre iguais, e sempre existiu - como um vizinho que leva o outro ao aeroporto por um trocado ou uma ajudacbet indiacasa.

Assim, a "sharing economy" - a economia do compartilhamento - virou "gig economy", também conhecida como economia dos bicos.

A última teria se associado aos ideaiscbet indiaigualdade da primeira, mas,cbet indiavezcbet indiapromover a troca diretacbet indiabens e serviços pela internet, "acabou se convertendo na oferta generalizadacbet indiatrabalhos mal pagos e sem qualquer segurança previdenciária", como escreveu o economista e professor da Universidade Federalcbet indiaSão Paulo (USP) Ricardo Abramovay, no prefácio do livro Uberização - A Nova Onda do Trabalho Precarizado,cbet indiaTom Slee.

A cultura que nos marcou e ainda nos marca segue a seguinte lógica: estudar, se formar, trabalhar e se aposentar. No entanto, desde os anos 1970, com as transformações do Toyotismo, o modelo que conhecemos estácbet indiacrise.

Para o professorcbet indiasociologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Giovanni Alves, o discursocbet indialiberdade ajuda as pessoas a aceitar essa nova realidade.

"O discurso ajuda o sujeito a se adaptar: você não vai mais dependercbet indiauma organização, agora você pode ser empreendedor, você é o responsável. Isso casa com um anseio verdadeiro das pessoas, que querem ter liberdade."

Ter o poder da escolha, argumenta o professor, tem um grande peso num mundocbet indiaque a maioria dos trabalhadores é reprimido pelo chefe. Depois do feudalismo, das monarquias e da escravidão, foi o capitalismo que inaugurou a ideologia da liberdade, ele explica,cbet indiapermitir a alguém gerir suas decisões.

"A escolha é real, porque você vai escolher entre estar no aplicativo ou num escritório. Agora, quando a realidade bate a porta? As pessoas têm uma renda, mas para isso precisam se matarcbet indiatrabalhar."

Smartphonecbet indiacarro

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Legenda da foto, Críticas dos cientistas sociais recaem sobre modo como a tecnologia é utilizada nos apps

As críticas dos cientistas sociais não recaem à tecnologia, mas a forma como ela é usada pelas empresas num cenáriocbet indiamilhõescbet indiadesempregados. É inegável que a relação entre app e parceiros tem seus pontos positivos, porque eles dão oportunidades a trabalhadores não teriam outra maneiracbet indialevar dinheiro para casa, pondera o antropólogo e sociólogo da Escola Superiorcbet indiaPropaganda e Marketing (ESPM) Fred Lucio. Mas ele afirma que é preciso analisá-la com olhar crítico.

Por não arcar com custos trabalhistas, por exemplo, as empresas poderiam dar uma remuneração maior aos seus colaboradores, alémcbet indiaoferecer garantias, defende o professor.

"Elas ficam com um percentual grande do valor e ao mesmo tempo não oferecem nenhum tipocbet indiaseguridade social. As pessoas estão fazendo duas, três jornadas, para ter uma renda razoavelmente boa."

Mesmo que os apps tragam novidades promissoras — oferecer possibilidadescbet indiaemprego ecbet indiadesenvolvimentocbet indiauma nova carreira, no caso dos youtubers —, diz Lucio, não se pode ignorar que as oportunidades se dãocbet indiacondições precárias, pelo menos para a maioria das pessoas. Para cada um que tem sucesso, afirma, há uma multidão "camelando".

"Tem elementos interessantes, como a criaçãocbet indiaespaços para as pessoas mostrarem seus dotes, mas os aplicativos usam dessa lógica para ganharcbet indiacimacbet indiauma massa que procura alternativas para sair da crise."

Isso não significa que é preciso demonizar a tecnologia e as empresas. O cenário digital, afirma o antropólogo, chegou para ficar, mas é preciso entender como estabelecer relaçõescbet indiatrabalho justas dentro dele e fazer pressão — a partir do Estado ecbet indiaentidades da sociedade civil — para que elas sejam postascbet indiaprática.

Cada um com acbet indiaculpa

VOCÊ ESTÁ TRABALHANDO DE FORMA ERRADA NA UBER 99POP

Se você faz isso, pare AGORA, antes que seja tarde demais!

Uber dá certo só dependecbet indiavocê.

Janeiro fraco? Só pros fraco !!! #motorista #uber #manaus

As frases acima são títuloscbet indiavídeos encontradoscbet indiauma busca rápida no YouTube. Além da ideiacbet indiaautonomia, explicada acima, elas vendem algo mais: a culpa.

Muito do conteúdo exibido online responsabiliza as pessoas por seu fracasso. Os vídeos listados, por exemplo, culpam os motoristas por não trabalharem mais, por não agradarem todos os clientes, por não conhecerem as plataformas a pontocbet indiaevitar tarifas maiores e até por não usarem roupa social, o que atrairia passageiros mais pobres e mal-educados.

"E eu te garanto, se você está cometendo um desses cinco erros que eu vou falar nesse vídeo, você está rasgando dinheiro ao sair pra rua", diz um dos youtubers, apontando para a câmeracbet indiadentro do carrro, enquanto uma melodiacbet indiareggae toca ao fundo.

Outros fatores, como a política das plataformas e a própria situação do país, não são considerados com cuidado. No fim, tudo depende do motorista.

Mãos no volante

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Legenda da foto, Vários vídeos no YouTube culpam motoristas por seu fracasso nas plataformas

"As pessoas não pensam que alguns problemas devem ser resolvidos coletivamente. A própria lógica dos aplicativos coloca os trabalhadores como concorrentes, porque quanto mais entregador tiver, menos corridas cada um vai fazer", diz o professor Bruno Cardoso, do Programacbet indiaPós-Graduaçãocbet indiaSociologia e Antropologia da Universidade Federal do Riocbet indiaJaneiro (UFRJ).

Nessa linhacbet indiaraciocínio, tudo seria individual, das possibilidadescbet indiafracasso às chancescbet indiasucesso. Seria algo como: "eu nunca vou sofrer um acidente, mas sou eu que vou ficar rico!".

Isso faz partecbet indiauma ideologia contraditória, diz Giovanni Alves. A liberdade do trabalhador, explica, é real, porquecbet indiatese ele pode fazer suas escolhas, mas, dadas as condições — desemprego, faltacbet indiaalternativas, um discurso que pode iludir —, ela não existe. Além disso, ela prometeria autonomia e felicidade ao mesmo tempocbet indiaque conduziria os trabalhadores para vagas cada vez mais precárias.

Professorcbet indiasociologia do trabalho da Universidade Estadualcbet indiaCampinas (Unicamp) e um dos maiores nomes do Brasil na área, Ricardo Antunes descreve o momento atual como a voltacbet indiaformas primitivascbet indiatrabalho.

"O trabalho desregulamentado não é novo, as mulheres trabalhavam 16 horas por dia na revolução industrial, mas agora isso vem com a tecnologia do mundo digital."

O momento que vivemos, Antunes argumenta, tem semelhanças com as primeiras formas do capitalismo, como a exploraçãocbet indiaoperários na Inglaterra, mas exibe uma nova roupagem.

Parte desse embrulho moderno estaria no vocabulário. Antunes diz que palavras como "metas", "colaboradores" e "parceiros" seriam rótulos que ocultam seu verdadeiro significado. Um parceiro, afirma, não tem os mesmos direitos e proteçõescbet indiaum funcionário. Mas também não é amigo do dono da empresa, como o nome pode sugerir.

"Esses professores, especialistas entre aspas, não concordo com eles, porque veemcbet indiafora. Analisar o trabalho dos outros é fácil", diz Marcio Juvino, o Entregadorcbet indiaLanches, ao telefone.

Ele aceita a visão dos "especialistas'cbet indiaalguns pontos. Sim, o trabalho não é fácil e há muitos riscos, mas essa é a tendência do mercado daqui para frente, Marcio responde. Seu argumento acabacbet indiaum lugar familiar: "ninguém é obrigado a fazer, faz quem quer".

"Não desisti, voltando às entregas" é o título do vídeo que Marcio publicou há três meses no seu canal, que tem 17 mil seguidores.

"Fala aí, rapaziada! Sejam bem-vindos a mais um vídeo no canal. Eu sou o Entregadorcbet indiaLanches, manos. Tô voltando depoiscbet indiatanto tempo e vou explicar o que aconteceu."

Em "Não Desisti", ele conta que um episódiocbet indiadepressão o fez dar uma pausa das plataformas, que complementam seu salário.

"Com a obra, o trabalho, eu saturei, sabe? O negócio foi tão pesado que eu sinceramente não sei o que ocasionou. Teve um gatilho, claro, mas...é normal, é o estresse do dia a dia."

Ele fala enquanto desvia dos carros num engarrafamentocbet indiaSão Paulo, guidão movendo-secbet indiaum lado para o outro para seguir no corredor estreito entre as luzescbet indiafreio.

No final, diz que está feliz por voltar. Fez duas entregas naquela noite, cada umacbet indiaR$ 10.

"Tem muito nego nos gruposcbet indiaFacebook, (falando) que os caras estão desvalorizando a categoria dos motoboys, fazendo entregacbet indiaR$ 5, mas, mano, fazendo entregacbet indiaR$ 5 foi que consegui chegar ao meu maior objetivo", ele diz, se referindo a construção dacbet indiacasa, enquanto a câmera mostra as ruascbet indiaSão Paulo, luzes e engarrafamento, à noite.

Cleber e Marlon Luz

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Para complementar a renda, Cleber (esq.) vende perfumes aos passageiros

Um paíscbet indiainformais

Em seu carro, estacionado no Pontocbet indiaApoio Motorista Top, Cleber tem uma loja. Ele estica o braço direito, amassando a camisa azul-claro, para alcançar o porta-luvas. Dali, tira pequenos frascoscbet indiavidro. São os perfumes que oferece a seus passageiros, caso perguntem por que ele cheira tão bem, conta, ao mostrar as embalagens. Não há nada no regulamento da Uber que impeça vendacbet indiaprodutos.

"Cada um é R$ 36. Mostro para o pessoal com mais dinheiro, da Bela Cintra, do Centro, (em São Paulo)."

O Brasil tem um históricocbet indiainformalidade que faz com que o trabalho por aplicativo não pareça tão estranho, dizem os professores entrevistados pela BBC News Brasil.

Filhos e netoscbet indiaempregadas domésticas, vendedores ambulantes, camelôs, feirantes e outras categorias tão comuns no país, o motorista ou entregador, principalmente secbet indiaclasses mais baixas, acharia natural não ter um vínculo formal com a empresa e ganhar pelo seu esforço. Muitas vezes, ponderam os especialistas, eles até preferem assim.

O gosto do brasileiro pelo trabalho informal têm suas origens na escravidão. Os "bicos" foram a primeira amostracbet indialiberdade para os negros.

O professorcbet indiaSociologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) Bruno Durães conta sobre a categoria dos escravoscbet indiaganho, que ficavam nas casas dos senhores ou nas cidades, e eram postos para trabalhar na rua. Poupados das atividades pesadas dos engenhos, muitos deles conseguiam, a partircbet indiapequenas vendas e serviços feitoscbet indiaparalelo às ordens dos seus donos, guardar dinheiro para comprarcbet indialiberdade.

"A condição escrava era a destruição do ser humano. Mas, ao mesmo tempocbet indiaque era a destruição, o trabalho permitia, na rua, que o escravo alcançasse autonomia por meio do seu esforço."

Assim, diz Durães, na cabeça dos brasileiros, a informalidade e o "seja seu próprio chefe" estão ligados a uma tradiçãocbet indialiberdade e resistência.

Escravos no Brasil no século 19

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Legenda da foto, Histórico da (e gosto pela) informalidade no Brasil vem da época da escravidão, diz sociólogo

Em um artigo publicado na Revista Brasileiracbet indiaHistória e Ciências Sociais, o pesquisador escreve como a partircbet india1870, com a crise do regime escravista, as ruascbet indiaSalvador passaram a ser um lugarcbet indialiberdade para os ex-escravos.

"Em certa medida, passam a trabalhar por si e para si, (a) realizar-se no trabalho. (...) Agora o trabalhador se apropria diretamente do produto do seu trabalho, sem a figuracbet indiaum ser estranho para lhe tomar os produtos e comandar seu processo produtivo."

A abolição não significou o fim do trabalho precário por aqui.

Para Vera Lucia Navarro, professora da Faculdadecbet indiaFilosofia, Ciências e Letrascbet indiaRibeirão Preto, da USP, apenas a formacbet indiaexploração mudou, da chibata para o cronômetro. No começo do processocbet indiaindustrialização no Brasil, explica, homens e mulheres chegavam a trabalhar 17 horas seguidas nas fábricas.

"Os industriais carregavam consigo a mentalidade escravocrata,cbet indiacasa grande e senzala. E ela ainda não foi extinta, como vimos há pouco tempo, com a dificuldadecbet indiagarantir os mínimos direitos para as domésticas."

Somado aos altos índicescbet indiadesemprego, esse histórico formaria o cenário ideal para empresas como Uber, Rappi, iFood e 99 crescerem no Brasil hoje, dizem os entrevistados.

As plataformas não costumam divulgar o númerocbet indiaentregadores ou motoristas ativos, ou se esse grupo se multiplicou, mas a colombiana Rappi, por exemplo, que começou a operar no paíscbet indiajulhocbet india2017, informa que suas entregas crescem 30% ao mês.

"No final, as empresas ganham duplamente: na faltacbet indiatradiçãocbet indiadireitos do Brasil - pagam qualquer valor e é isso mesmo -, e no discurso que mexe com o orgulho do povo", diz Durães.

Entregadorcbet indiaUber Eatscbet indiaKiev

Crédito, REUTERS/Valentyn Ogirenko

Legenda da foto, Entregadorescbet indiaapp reclamam do cansaço das longas jornadas

Cansaço

Mateus se sente como um fantasma. Ele, que não dá seu nome nesta reportagem, perde a identidade quando faz entregas. Torna-se mais um colaboradorcbet indiajaqueta e mochila colorida nas costas, das dezenas que encontra por dia nas ruascbet indiaSão Paulo.

"Acontece um processocbet indiadespersonificação. Não veem a gente como humano, mas como bichos, escravos, principalmente os restaurantes."

Ele dá exemplos. Mesmo sob chuva forte, precisa esperar do ladocbet indiafora pelos pacotescbet indiacomida; copos d'água são frequentemente negados e o uso do banheiro, proibido; há um olhar constantecbet indiadesconfiança - "não vai furtar os lanches, viu".

Ser entregador o levou a enxergar as coisas com outros olhos. Nãocbet indiadesconfiança, mascbet indiadesgosto. Lembra-secbet indiaquando era bombeirocbet indiashoppings ou bancos, da "auracbet indiasalvador" que o uniforme lhe emprestava e do consequente respeito que inspirava nas pessoas. A mochilacbet indiamotoboy não tem o mesmo efeito.

"Estou numa posição subserviente e vi um lado do ser humano que não via antes. Já peguei sobrenome dos (clientes) que me tratam mal, vou pesquisar no Facebook e são pessoas que apoiam causas sociais, esquerdistas, mas que tratam mal o empregado. É um discurso hipócrita."

Mudou a forma como os outros tratam Mateus e também como ele trata a si mesmo, "sem muita dignidade", nas suas palavras. Como trabalhacbet indiadez a doze horas por dia, o pouco tempo que tem fora da cama não é suficiente para preparar almoço, jantar ou fazer qualquer outra coisa.

A faltacbet indiaum horário regular para comer - os horários das refeições são oscbet indiamaior demanda no aplicativo - o fez passarcbet india74 kg para 65 kg nos últimos dois anos. Essas não foram as únicas transformações que notoucbet indiaseu corpo.

"Sou outra pessoa. Tinha uma pele mais limpa e agora meu poros são dilatados, sou queimadocbet indiasol e meu cabelo cai por causa do estresse."

Eram 16h quando Mateus atendeu a reportagem e ele ainda não havia almoçado. Na rua desde as 8h, esperava o restaurante do Bom Prato, programacbet indiaassistência social do governocbet indiaSão Paulo, abrir para jantar. É que lá a comida custa R$ 1, explicou.

Empresas que participam da Associação Brasileiracbet indiaOnline to Offline

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Legenda da foto, Associação Brasileiracbet indiaOnline to Offline defende interessescbet indiaempresascbet indiaaplicativo

As empresas

Não há uma entidade que represente os interessescbet indiatodas as empresascbet indiaplataforma, mas parte delas, como Loggi, iFood e 99, está reunida na Associação Brasileiracbet indiaOnline to Offline (ABO2O).

A reportagem procurou a associação para entender a visão dessas companhias sobre os assuntos discutidos acima, principalmente sobre o confronto entre o discurso divulgado por elas e a realidadecbet indiatrabalho dos parceiros.

Diretorcbet indiaEngajamento da ABO2O, Marcos Carvalho disse que está acontecendo "uma verdadeira revolução" na forma como as pessoas se relacionam com o ambiente, não existindo mais uma diferença tão grande entre os mundos físico e digital.

"É uma quebracbet indiaparadigma. O indivíduo tem uma nova formacbet indiase relacionar e isso se aplica também ao sistemacbet indiaprestaçãocbet indiaserviço."

Para ele, criada nos anos 1940, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) é antiquada e precisa ser adaptada para uma formacbet indiacontratação do século 21.

No seu formato atual, mesmo com as modificações feitas pela reforma trabalhistacbet india2017, ela sobrecarregaria os empresárioscbet indiaregulações e burocracias que travam os negócios.

"É muito retrógrado, emperrando o serviço."

As limitações estariam também do lado do colaborador, que ao ter registro na carteiracbet indiatrabalho não desfruta da mesma liberdade oferecida pelos aplicativos. As plataformas dariam a ele a possibilidadecbet indiase dedicar mais e ganhar mais,cbet indiaacordo com seus objetivoscbet indiavida. Fazer uma jornada maior por desejocbet india"escalar a classe social" é algo "normal e comum do ser humano", explica Carvalho.

"Quero trabalhar mais para comprar um imóvel ou menos, porque quero o básico, cada um tem suas ambições."

Ele cita outros dados da pesquisa sobre entregadores feita pela Fundação Institutocbet indiaAdministração (FIA) entre fevereiro e março deste ano: 74,6% disseram que não obrigados pelo aplicativo a realizar entregas e 87% aumentaram seus ganhos com os apps.

Outros 72,7% têm neste serviçocbet indiaprincipal fontecbet indiarenda. Isso, para Marcos, mostraria a importância das plataformas neste momento do Brasil.

"São 13 milhõescbet indiadesempregados. Se pegar o contingentecbet indiamotoristas e entregadores, são 5,5 milhões. Olha o benefício que estão trazendo para o país."

Questionamentos a essa linhacbet indiaraciocínio, no entanto, são feitas até mesmo por representantes do empresariado. O diretor geral do Instituto Capitalismo Consciente Brasil, Hugo Bethlem, acredita que as empresascbet indiaplataforma deveriam ser mais cuidadosas ao lidar com seus colaboradores.

Ele concorda com Carvalho sobre as possibilidades que a tecnologia trouxe para os desempregados, mas considera que uma gestão mais consciente é necessária.

"Quanto mais horas eu trabalhar, mais dinheiro eu ganho, mas qual é o limite do stress? Esses bônus por entrega só olham para o entregador-empresa, não pessoa física, e põemcbet indiarisco a saúde dessas pessoas."

Bethlem diz considerar os dois lados da moeda: num deles, é "super-apoiador" da economia compartilhada e prega a livre iniciativa sem intervenção do Estado; no outro, acredita que não pode haver uma pressão tão grande da empresa sobre o entregador, o que afetaria a qualidade do serviço.

Sua recomendação para o setor seria: ganhar menos para ganhar sempre.

Tais mudanças devem ser feitas pela iniciativa privada, enfatiza Bethlem, e não passar pelo poder público. Quando iFood e Loggi fecharam um acordo com a Prefeituracbet indiaSão Paulo, por exemplo, para acabar com os bônus por entrega, se submeteram a uma situação desnecessária, que poderiam ter evitado se alterassem suas regras por conta própria.

"Tem que falar 'vem trabalhar comigo, porque você não vai ganhar bônus por velocidade, mas porque foi cordial'. É preciso achar outro sistema."

Homem segura carteiracbet indiatrabalho

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Legenda da foto, Perguntadas se consideram alto desemprego do paíscbet indiasuas decisões, apps disseram ser opçãocbet indiamomentocbet indiacrise

A relação entre empresa e prestadorcbet indiaserviço deveria ser mais humanizada, ele argumenta.

A BBC News Brasil procurou todas as empresas citadas pelos entrevistados (99, Uber, Uber Eats, Rappi e iFood), questionando, entre outros pontos, se elas levamcbet indiaconsideração a realidadecbet indiaalto desemprego do Brasil e a busca dos apps como formacbet indiasobrevivênciacbet indiasuas decisões. A pergunta feita foi: num contextocbet indiaque milharescbet indiabrasileiros dependem das entregas para pagar o aluguel podemos falarcbet india"livre escolha"?

A maioria delas respondeu que oferece uma saída aos desempregados que, sem os aplicativos, não teriam outras opções.

Uber e Uber Eats disseram que "os entregadores parceiros são independentes, escolhem como e quando utilizarão o aplicativo como geraçãocbet indiarenda". Também informaram que "no Brasil, 80% dos entregadores parceiros ativos no Uber Eats passam menoscbet india20 horas da semana online".

A 99 respondeu quecbet india"missão é fornecer oportunidadescbet indiageraçãocbet indiareceitas para os motoristas e suas famílias. Por isso, maiscbet india600 mil condutores escolheram o aplicativo como principal formacbet indiaganhar a vida ou como complementocbet indiarenda,cbet india1,6 mil cidades do país."

A Rappi informou,cbet indianota, que entende a situaçãocbet indiadesemprego no Brasil é "complexa" e "dependecbet indiainúmeros fatores externos" à companhia.

"Porém, acreditamos que, ao oferecer às pessoas a possibilidadecbet indiafazer entregas por meio da plataforma, contribuímos para que possam ganhar algum tipocbet indiarenda diante desta situação."

O iFood afirmou que gera oportunidade para cercacbet india120 mil entregadores independentes que já utilizaram a plataforma: "esse número é ainda mais importante se pensarmos no cenário brasileiro do desemprego, que abrange maiscbet india13 milhõescbet indiapessoas".

Motoristascbet indiaaplicativos fazem buzinaçocbet indiafrente ao Congresso Nacionalcbet india2017,cbet indiaprotesto contra projeto que regulamentaria aplicativoscbet indiatransporte privado

Crédito, Marcelo Camargo/Agência Brasil

Legenda da foto, Protestocbet indiamotoristascbet india2017; para professores, trabalhadores do app estão começando a se organizar

Trabalhadores unidos?

Neste momento, há 781 mensagens não lidas nos três gruposcbet indiaWhatsAppcbet indiaentregadores nos quais a BBC News Brasil entrou. Eles reúnem 523 pessoas, principalmentecbet indiaSão Paulo.

Com exceçãocbet indiaeventuais vendascbet indiacapacetes e mochilas, as trocas são basicamente perguntas:

Já aconteceu com vocês? O que fazer? Onde fica? Quanto custa? Do que preciso para…?

De alguma forma, os motoristas e entregadores encontram maneiras para se organizar, dizem os professores entrevistados.

Mesmo que os sindicatos sejam chamados por elescbet indiacorruptos, antiquados ou atrasados, é inevitável que surjam novos modeloscbet indiaorganização, afirmam. Mesmo que esses não sejam muito eficazes.

O professor do Departamentocbet indiaGeografia do Institutocbet indiaGeociências da Universidade Federalcbet indiaMinas Gerais (UFMG) Fábio Tozi cita as organizaçõescbet indiamotoristascbet indiaUber, que, para ele, apresenta uma pauta pulverizada e costumam defender a empresa. A mais importante delas é a Associaçãocbet indiaMotoristascbet indiaAplicativocbet indiaSão Paulo (Amasp), que tem Marlon Luz como vice-presidente.

Em posts recentes, a associação cobrou as autoridades pelas mortescbet indiacinco motoristas na região metropolitana da cidade. As cobranças às empresas, no entanto, foram bem mais discretas.

"Mais um assassinatocbet indiaum motoristacbet indiaaplicativo...Mais um caso fora dos apps...O nosso presidente Duda já vem alertando inclusive foi o tema dele na Alesp, que não adianta os apps elaborarem métodoscbet indiasegurança sem que o governo também faça a parte dele, continuaremos reféns dos marginais!!!", diz uma postagem feita na páginacbet indiaFacebook da Amasp no dia 2cbet indiaoutubro.

Para Tozi, que estuda como os aplicativoscbet indiatransporte mudam questões sociais e o planejamento das cidades, entidades como essa querem mais segurança para os motoristas, mas sem batercbet indiafrente com as plataformas.

Procurada, a Amasp respondeu,cbet indianota, que foi a primeira associação a conseguir reuniões com todos os aplicativos pedindo reajustecbet indiatarifas e mais segurança,cbet india2017.

"Todos os apps responderam que iriam analisar e pouco tempo depois a Uber e a 99 reajustaram tarifascbet indiaalgumas cidades do Brasil, lugares pontuais, e também firmaram parcerias para reduzir os custos dos motoristas."

Outra ação teria sido processar as empresas quando motoristas foram excluídoscbet indiaforma considerada inválida. No entanto, continuou a associação no comunicado, muitas vezes o "bom relacionamento" com os aplicativos permitiu que um processo não fosse necessário para religar o motorista.

A Amasp também lembrou que "corre atráscbet indiaresultados", ao contrário dos sindicatos, que ficariam "apenas gritando ao vento."

Post da Amasp no Facebook

Crédito, Reprodução Facebook

Legenda da foto, Para professor, Amasp tenta melhorar situação dos motoristas sem batercbet indiafrente com as empresas

As mesmas críticas feitas às associações, diz Tozi, valem para a maioria dos youtubers deste nicho. Eles teriam uma relaçãocbet indiasubordinação com as empresas, que começaria com a pressão do algoritmo durante as corridas e acabaria na tela do computador, com a repetiçãocbet indiadiscursos divulgados por Uber, 99, iFood e Rappi.

Há algum sinalcbet indiaconscientização entre os motoristas, pondera Bruno Cardoso, professor da UFRJ. Em maio, por exemplo, milharescbet indiaparceiros da Uber no Brasil pararam por 24 horascbet indiaadesão a uma greve mundial.

No entanto, ele concorda que os youtubers são obstáculos ao desenvolvimentocbet indiaum olhar mais crítico, porque alémcbet indiarepetirem o discurso das empresas, mostram como estão ganhando muito dinheiro ao segui-lo.

"Não é o motorista comum, que dirige doze horas por dia, que tem um canal grande, porque canal exige ediçãocbet indiavídeo, capacidadecbet indiagravar e tudo isso é tempo. Assim, quem tem visibilidade já é bem sucedido."

Como formadorescbet indiaopinião, afirma, eles não oferecem um espaçocbet indiadebate para colegas que tiveram uma experiência ruim com as plataformas. Ao contrário, suas falas reforçariam seu sucesso e culpariam seus inscritos pelo próprio fracasso.

"Aí não é a estrutura que leva as pessoas a enlouquecerem, adoecerem ou ficarem pobres, são elas que são preguiçosas."

Após ouvir a opiniãocbet indiaTozi, Marlon Luz diz ao telefone que ele deveria dirigir um pouco para ter uma visão mais realista. O youtuber argumenta que chegou a encontrar,cbet indiagruposcbet indiaWhatsApp, motoristas que ganham até R$ 400 por dia.

"Reflete a realidade da maioria?", ele pergunta do outro lado da linha. "Não. Mas a gente ensina como chegar lá."

Além disso, continua, há youtubers que trabalham 12 horas e ainda gravam seus vídeos, apesarcbet indiaesses não serem os mais conhecidos. Marlon admite que o desemprego é um problema e que nem todo mundo está felizcbet indiaser colaboradorcbet indiaaplicativo, mas pondera que os ganhos compensam.

"Trabalhando o mesmo tempo, o motorista ganha pelo menos o dobro do salário mínimo."

Nos vídeos, no entanto, ainda há muitas promessas que não se concretizam. Em alguns deles, motoboys mostram extratoscbet indiaR$ 5 mil, às vezes não revelando quantos quilômetros rodaram para acumular o valor.

Então há quem chegue com a ilusãocbet indiaque vai ganhar muito dinheiro, diz Mateus, o ex-bombeiro. Assim, fica difícil dividir críticas com outros entregadores, porque a mentalidade do "só dependecbet indiavocê" faz a competição entre eles aumentar. Muitos não querem ouvi-lo, acreditando que ele se queixa para desanimar os concorrentes.

Ao fim da entrevista, Mateus diz que a faltacbet indiadiálogo não o incomoda mais. Seu tom tem algocbet indiaironia ou indiferença.

"Eles não enxergam que podem ter uma sériecbet indiaproblemascbet indiacoluna,cbet indiarespiração, e tudo isso vai ser cobrado. É questãocbet indiatempo."

Os professores entrevistados se dividem sobre as possíveis reações desses motoristas e entregadores no futuro. A maioria faz a mesma ponderação: sim, a realidade é dura e eles irão percebê-la logo, mas parte desses brasileiros depende dos aplicativos para sobreviver. Se não há opções, o que fazer?

Ricardo Antunes

Crédito, Antonio Scarpinetti/Unicamp

Legenda da foto, Tolerância dos motoristas e entregadorescbet indiaapp têm um limite, diz o professor Ricardo Antunes

Há um limite, defende Ricardo Antunes, da Unicamp. Quem está desesperado aceita regimes menos garantidos, mas num dado momento as taxas baixas, as jornadas longas, a desvalorização vinda da empresa e dos clientes será tão forte que não vai segurar uma resposta.

"Que sociedade consegue manter tantos milhõescbet indiadesempregados? São muitas contradições para você controlar e as tensões normalmente transbordam o espaço do trabalho, se esparramam para as periferias, para os lugares onde os trabalhadores moram."

Isso sem falar nos limites físicos. O ideário das empresas, argumenta o professor, "viram pó", quando o colaborador percebe que só ele está ralando todos os dias.

"É (dar) o tempo das depressões, do acidente, da morte, da infelicidade, da resistência, da organização e da busca por uma alternativa."

Neste momento, há 16 mensagens não lidas nos três gruposcbet indiaWhatsApp. Ao entrar nas conversas e buscar por "protesto", encontra-se a seguinte conversa, no dia 26cbet indiajulho:

Winchester diz:

"Meu primo foi atropelado tá com a perna quebrada"

"A empresa uber eats diz Q o erro foi dele como não tem provacbet indiafilmagem"

"A uber dis Q ele não prestou atenção"

"Então a cupa não é do motorista mas sim dele"

E Daniel responde:

"E pior que querem a prova na mesa"

(...)

Winchester termina o assunto:

"Tem Q ter um protesto sobre nossos direitos."

Veículo autônomo da Uber expostocbet indiaevento da empresacbet indiasetembro, na Califórnia

Crédito, PHILIP PACHECO/AFP/Getty Images

Legenda da foto, Veículo autônomo da Uber expostocbet indiaevento da empresacbet indiasetembro, na Califórnia

Futuro

Os que estão esgotados devem sair e outros irão substituí-los. O cenário é desenhado pelo professor Fábio Tozi para os motoristas e entregadorescbet indiaaplicativo, caso o desemprego não caia.

"Os motoristas que a gente acompanha (na nossa pesquisa) pretendem sair assim que possam, porque se torna insuportável."

Os substitutos tendem a ser pessoas mais jovens, saudáveis e entusiasmadas, que acabaramcbet indiacomeçar nesse tipocbet indiaatividade, acrescenta Bruno Cardoso, da UFRJ. À medida que fica cada vez mais fácil entrar nesse mercado, especialmente nocbet indiaentregadorescbet indiaque nem motos mais são necessárias, explica, forma-se um exércitocbet indiacandidatos aptos a iniciar o serviço a qualquer momento.

Com entregascbet indiabicicleta e até a pé, a única coisacbet indiaque precisam são pernas e um celular com internet.

Para além do esgotamento físico, motoristas e entregadores enfrentarão no futuro o desaparecimentocbet indiasuas vagas.

Emilie Boman, chefecbet indiapolíticas públicas da Uber Eats

Crédito, PHILIP PACHEPHILIP PACHECO/AFP/Getty Images

Legenda da foto, Emilie Boman, chefecbet indiapolíticas públicas da Uber Eats, fala sobre abrangência da empresa

Em junho, a Uber informou que iria começar a testar um sistemacbet indiaentregacbet indiacomida com drones e apresentou um protótipocbet indiaveículo autônomo, capazcbet indiaser completamente independente. Segundo a companhia, por motivos logísticos, os drones não fariam as entregas diretamente aos clientes, mas deixariam o pedidocbet indiaum pontocbet indiacoleta para que o entregador completasse o pedido.

"A empresa quecbet indiadez anos tornou-se uma das mais poderosas do mundo explorando o trabalho humano já sonha com um futuro sem trabalho humano. Você imagina?", questiona Ricardo Antunes.

Não é só uma percepção. Um estudo feito pelo Laboratóriocbet indiaAprendizadocbet indiaMáquinacbet indiaFinanças e Organizações da Universidadecbet indiaBrasília (UnB) mostrou que as máquinas movidas por tecnologiacbet indiainteligência artificial devem, até 2016, ocupar 54% dos empregos formais do país. A porcentagem representa cercacbet india30 milhõescbet indiavagas.

Os youtubers já pensam nesse cenário. Eles não encaram os aplicativos como algo que vá durar "o resto da vida".

"É uma profissão sem futuro", define Marlon.

Há dois principais motivos para esse fim anunciado, ele enumera: não há progressãocbet indiacarreira — um motorista será sempre um motorista — e os carros que se dirigem sozinhos já são uma realidade.

"Não é questãocbet indiase vai existir, mascbet indiaquando. Realmente, não tem futuro."

Pedro Roseno

Crédito, Felix Lima/BBC News Brasil

Legenda da foto, Há três meses, Pedro anunciou no YouTube que largaria o trabalho fixo para ficar só nos apps
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Quando Pedro saicbet indiacasa, celular no suporte da moto e mochila nas costas, a reportagem o seguecbet indiacarro. É preciso ficar atento porque mochilas coloridas se juntam a ele nos semáforos, misturando os tons gritantes dos tecidos com o amarelo e vermelho das luzescbet indiafreio e dos postes.

"Tem muita gente que reclamacbet indiabarriga cheia", foicbet indiaconclusão depoiscbet indiaquase duas horascbet indiaentrevista. Não dá para criticar as empresas, explicou, porque são elas que dão o dinheiro. Meses depois desta conversa, ele cumpriu o prometido e pediu demissão do emprego.

"Se tem um aplicativo que tá te pagando, e a pessoa fala que não tem onde trabalhar, tá reclamandocbet indiabarriga cheia, assim, no sentido figurado", disse, antescbet indiafechar a porta.

Quando Pedro saicbet indiacasa, não tem tempocbet indiacomer. Na pia, seguem os restoscbet indiaarroz e feijão.

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