É proibido se dizer nazista ou negar Holocausto no Brasil? O que dizem leis e especialistas:o jogo de aposta

o jogo de aposta A Lei do Racismo (nº 7.716/89) estabelece que é crime no Brasil "fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para finso jogo de apostadivulgação do nazismo", sob penao jogo de apostadois a cinco anoso jogo de apostaprisão e multa. Mas o que dizero jogo de apostaoutros atos não expressamente previstos na lei, como fazer uma saudação nazista, se declarar antijudeu, defender a existênciao jogo de apostaum partido nazista ou negar o Holocausto?

A resposta não é clara e óbvia, dizem especialistas, mas o espírito e as intenções da legislação brasileira como um todo (a começar pela Constituição) e decisões anteriores da Justiça tendem a levar sim à condenaçãoo jogo de apostaquem praticar esses atos no Brasil.

Condutas como negar o Holocausto, algo proibido na Alemanha eo jogo de apostaoutra dezenao jogo de apostapaíses, poderiam ser enquadradas tanto na Lei do Racismo quantoo jogo de apostaincitação ou apologia ao crime ou crime contra a honra, por exemplo. Mas isso não é consenso entre juristas, e no fim cada caso é um caso.

"Pode haver um juiz que diga que não está previsto na lei (que seria proibido defender a existência do partido nazista). Mas o nazismo representa o mal, a crueldade, a intolerância, o racismo, e por isso deve-se não se atentar apenas ao que está estritamente no texto da lei, mas aos valores fundamentais da dignidade humana, inclusive previstos na Constituição. Seria um raciocínio raso entender que seria permitido negar o Holocausto", afirmou Milena Gordon Baker, advogada criminalista e autora do livro Criminalização da Negação do Holocausto no Direito Penal Brasileiro,o jogo de apostaentrevista à BBC News Brasil.

"Quando se defende o partido nazista, não se defende a democracia. Pelo contrário, se está querendo destruir a democracia."

É importante deixar claro ainda que a liberdadeo jogo de apostaexpressão não é um direito absolutoo jogo de apostanenhum país, e no Brasil não serveo jogo de apostasalvaguarda para quem comete outros crimes, como oo jogo de apostaracismo.

"A Constituição consagra o binômio: liberdade e responsabilidade. O direito fundamental à liberdadeo jogo de apostaexpressão não autoriza a abominável e criminosa apologia ao nazismo", escreveu no Twitter o ministro Alexandreo jogo de apostaMoraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

O debate sobre o que deve ser proibidoo jogo de apostatorno do nazismo teve início ao redor do mundo logo após o genocídio cometido pelo regime liderado por Adolf Hitler durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), que matou maiso jogo de aposta6 milhõeso jogo de apostajudeus, alémo jogo de apostaadversários políticos, negros, homossexuais, pessoas com deficiência, comunistas, integrantes da etnia roma e outras minorias.

E voltou à tona no Brasil recentemente depois que o apresentador Monark e o deputado federal Kim Kataguiri (que se filiará ao Podemos) defenderamo jogo de apostaum podcast ao vivo que o país deveria permitir a existênciao jogo de apostaum partido nazista, sob o pontoo jogo de apostavista da liberdadeo jogo de apostaexpressão (a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos). Pouco depois,o jogo de apostaum programa da Jovem Pan, o comentarista Adrilles Jorge, ao tratar do tema, fez um gesto entendido como uma saudação nazista.

Monark acabou desligado do programa do qual era apresentador e sócio, Kataguiri deve enfrentar um processo na Comissãoo jogo de apostaÉtica da Câmara dos Deputados e ambos ainda são alvoo jogo de apostainvestigação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sob suspeitao jogo de apostaapologia ao nazismo. Adrilles, poro jogo de apostavez, foi demitido da emissora e denunciado ao Ministério Público Estadual, que também deve abrir uma investigação sobre o caso.

Os três pediram desculpas, mas negaram qualquer ilegalidade.

A lei brasileira proíbe alguémo jogo de apostaser nazista ou racista?

O advogado criminalista Davi Tangerino, professoro jogo de apostadireito da FGV-SP, entende que não. Segundo ele, o Direito não tem como regular o que uma pessoa é, mas o que ela faz.

"Qual é que é o poder do Direitoo jogo de apostamudar a essênciao jogo de apostauma pessoa? Mas o que uma pessoa anti-qualquer-coisa não pode fazer? Assumir condutas discriminatórias ou que façam apologia ou incitação da discriminação. A saudação é uma apologia porque ela traduz um valor. Quando você terminao jogo de apostafala, que primeiro relativiza o nazismo e depois termina com uma saudação nazista, ele está propagando a ideia nazista", afirmouo jogo de apostaentrevista à BBC News Brasil.

Em seu Twitter, Adrilles afirmou que todao jogo de apostafala sobre o caso foi crítica à defesao jogo de apostaum partido nazista e que "imputar um falso crime a alguém é um crime. Serão responsabilizados todos aqueles que exercem seu ódio me colando falso discursoo jogo de apostaódio por um gesto deturpado".

E no caso da defesa da existênciao jogo de apostaum partido nazista, isso seria enquadrado como apologia? Mais uma vez Tangerino argumenta que não.

"Ele (Monark) não estava dizendo que as pessoas deveriam ser nazistas, não estava dizendo que o nazismo é bacana. Estava apenas, por mais odioso que isso seja, levando um argumento liberal tosco às últimas consequênciaso jogo de apostaque todo mundo pode pensar o que quiser. Isso, para mim, não é nem incitação nem apologia ao nazismo. No final do dia, não pode ser crime você sustentar que um determinado crime deixeo jogo de apostaser crime, porque senão você fechao jogo de apostamaneira autoritária o debate público sobre o que deve ser crime ou não."

O especialista compara o caso com a Marcha da Maconha. "É apologia às drogas? As decisões dos tribunais foram se consolidando mostrando que não. Você pedir a descriminalizaçãoo jogo de apostauma conduta não é apologia àquela conduta. Então, eu acho que a mesma lógica se aplica aqui, muito embora, é claro, você advogar o consumoo jogo de apostamaconha, do pontoo jogo de apostavista material, é totalmente diferenteo jogo de apostavocê sustentar a existência do nazismo. Mas a metarregra é a mesma."

Ivar Hartmann, advogado e professor associado do Insper, tem entendimento semelhante. "Existe uma diferença entre incentivar pessoas a cometer um crime e defender alterações na lei para que essa mesma prática deixeo jogo de apostaser considerada um crime", disseo jogo de apostaentrevista ao jornal Folhao jogo de apostaS.Paulo.

Thiago Amparo, advogado e professoro jogo de apostadireito internacional e direitos humanos na FGV-SP e da FGV-Rio, discorda da distinção entre tese processual (defender que exista o partido nazista) e tese substantiva (defender a tese nazista).

"Sustento que, aqui, não há essa divisão: defender que um partido busque políticas nazistas é o mesmo que tolerá-las", escreveuo jogo de apostaseu perfil no Twitter.

Negação do Holocausto como discursoo jogo de apostaódio e incitação à violência

Tangerino também não considera a negação do Holocausto um crime previsto na legislação do país, porque seria a contestação sem fundamentoso jogo de apostaum fato histórico, mas a relativização do Holocausto, seria sim um crime.

"Você não pode justificar o Holocausto comparando com outra experiência, não pode dizer que algo como 'o Holocausto comparado com o extermínio comunista mostra que foi menos'. Você não pode comparar valorativamente o Holocausto porque, ao fazer isso, você estáo jogo de apostaalguma forma justificando, corroborando, aceitando a prática nazista."

Baker discorda. Ela defende que haja a tipificação expressa da negação do Holocausto no Código Penal brasileiro, mas argumenta que hoje essa prática seria considerada crime na Justiça brasileira mesmo não estando expressamente prevista na lei.

"A lei tenta ser a mais clara possível, porque no Brasil temos um princípio da legalidade, ou seja, tudo que a gente quer proibir tem que estar previsto na lei. Mas evidentemente é impossível que uma lei preveja todas as incidências, e por isso que existem os juízes, que vão interpretar o texto legal, e as emendas nas leis originais. Mas a intenção da lei e da Constituição é clara."

Ela cita como exemplo o caso do editor Siegfried Ellwanger, condenadoo jogo de aposta2000 no Supremo Tribunal Federal pelo crimeo jogo de apostaincitação ao racismo por contestar a existência do Holocausto e propagar outras ideias antissemitaso jogo de apostaum livro. O debate no Supremo girou principalmenteo jogo de apostatorno da liberdadeo jogo de apostaexpressão eo jogo de apostadiscursoo jogo de apostaódio.

A advogada menciona também o artigo 17 da Convenção Europeiao jogo de apostaDireitos Humanos, que proíbe o usoo jogo de apostaum direito (como a liberdadeo jogo de apostaexpressão) para a destruiçãoo jogo de apostaoutros direitos ou liberdades. Assim, a negação do Holocausto tem sido entendida por Cortes europeias como um abuso da liberdadeo jogo de apostaexpressão, incitação à violência e ataque à honra e à dignidade do povo judeu.

"A negação do Holocausto representa a ideiao jogo de apostaque os judeus como pessoas manipuladoras, enganosas e controladoras mentemo jogo de apostarelação ao Holocausto, querendo gerar benefícios para eles como se estivessem conspirando contra o mundo. É evidente que essa mensagem promove uma animosidadeo jogo de apostarelação ao povo judeu", escreve ela emo jogo de apostateseo jogo de apostadoutorado sobre o tema.

Para Baker, esse negacionismo é um discursoo jogo de apostaódio que ataca três bens jurídicos (a igualdade, a honra e a paz) e por isso deve ser punido pela lei.

"O pior e mais relevante são as consequências práticas no dia a dia das pessoas alvo dessas mensagens (negacionistas). Essas minorias se sentem inibidas, intimidadas no seu ir e vir; muitas vezes largam o emprego, deixamo jogo de apostair à escola, evitam ir a certos lugares, ficam e se sentem desprovidaso jogo de apostapoder dar uma resposta."

Há diversos projetoso jogo de apostaleio jogo de apostatramitação no Congresso para criminalizar expressamente a negação ou relativização do Holocausto (ou shoah,o jogo de apostahebraico, que remete a catástrofe, destruição). Mas o que seria esse crime na prática? O projetoo jogo de apostalei do deputado federal Robertoo jogo de apostaLucena (Podemos-SP), por exemplo, cita oito aspectos mostrando que o negacionismo não se resume apenas a argumentar que o genocídio não aconteceu:

"A depreciação (ou a minimizaçãoo jogo de apostasua escala e impacto), a deflexão (ou minimizaçãoo jogo de apostaresponsabilidades individuais ou nacionais), as alusõeso jogo de apostaequivalência antes da guerra eo jogo de apostatempoo jogo de apostaguerra (como formao jogo de apostabanalizar o ocorrido, quando os fatos colacionados pelas Forças Aliadaso jogo de apostacamposo jogo de apostaconcentração demonstram a não precedência da escala e dos requinteso jogo de apostacrueldade), as alusõeso jogo de apostaequivalência pós-guerra (por razões assemelhadas), a inversão (culpabilização dos judeus pelo próprio destino ou culpabilização dos judeus por supostas ações assemelhadas, quando, novamente, os fatos históricos confirmam não haver critérioo jogo de apostacomparação), as acusaçõeso jogo de apostaabuso da memória (formao jogo de apostazombaria aos judeus alegando que enfatizam demais o tema do Holocausto), a obliteração ou o silenciamento da memória (o impedimentoo jogo de apostaque açõeso jogo de apostamemória ocorram) ou a universalização ou trivialização do Holocausto como crimes (a comparação leviana do Holocausto com qualquer quadroo jogo de apostagravidade e não desejado supostamente atentatório das direitos humanos)."

Liberdadeo jogo de apostaexpressão no 'mercadoo jogo de apostaideias' dos EUA

Em debates sobre liberdadeo jogo de apostaexpressão e discursoo jogo de apostaódio, os Estados Unidos costumam ser citados como exemplo máximoo jogo de apostase dizer o que pensa, inclusive ofensas raciais.

Não há uma definição universal sobre o que é discursoo jogo de apostaódio, mas segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), ele pode ser entendido como qualquer tipoo jogo de apostacomunicação que ataque ou use termos pejorativos contra uma pessoa ou um grupo com base emo jogo de apostareligião, nacionalidade, etnia, coro jogo de apostapele, raça, gênero ou qualquer outro elementoo jogo de apostaidentidade.

A tolerância ao discursoo jogo de apostaódio variao jogo de apostaum país para outro. "O sistema jurídico americano proíbe o discurso do ódio o mais tarde possível — apenas quando há perigo iminenteo jogo de apostaatos ilícitos. A jurisprudência alemã coíbe o discurso do ódio o mais cedo possível", exemplifica o jurista alemão Winfried Brugger.

No Brasil, a lei federal 7.716/89 prevê prisão para quem comete discriminação contra os outros por causao jogo de aposta"raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional."

O ordenamento jurídico alemão é o melhor exemplo do que ficou conhecido como "democracia militante" ou "democracia defensiva".

"É um requisitoo jogo de apostauma democraciao jogo de apostafuncionamento que as pessoas tolerem ideias com as quais discordam. No entanto, alguns discursos, alguns grupos, alguns partidos podem ser tão prejudiciais que os políticos e o público concluem que os riscos que eles representam superam os benefícioso jogo de apostaprotegê-los. Os alemães viramo jogo de apostaprimeira mão onde o nazismo pode levar e por isso mesmo a Alemanha está entre os defensores mais ativos do que é chamadoo jogo de aposta'democracia militante' —o jogo de apostaoutras palavras, a noçãoo jogo de apostaque a democracia deve ser defendida, mesmo ao custoo jogo de apostarestringir algumas liberdades quando essas liberdades estão sendo exploradas para minar a democracia", afirmou Erik Bleich, professor da Faculdade Middlebury College,o jogo de apostaentrevista à BBC News Brasil.

Segundo ele, a Alemanha é a democracia mais restritiva enquanto os Estados Unidos, onde é relativamente comum ver manifestações da extrema direita com suásticas e símboloso jogo de apostasupremacia branca, têm menos regulações.

"Ambos os países ainda permitem uma variedade muito grandeo jogo de apostadiscursos e ações,o jogo de apostadiversos espectros ideológicos. A parte difícil dessa história para as democracias é descobrir como restringir, banir ou punir apenas os discursos, grupos e partidos realmente perigosos, deixando o escopo mais amplo possível do que é permitido. Diferentes países desenvolveram soluções diferentes para este enigma".

Tangerino, da FGV-SP, afirmou que o Brasil adotou uma espécieo jogo de apostacaminho do meio entre esses dois polos. Ou seja, no entendimento dele, no país "pode-se admitir no campo das ideias a existênciao jogo de apostauma organização nazista no Brasil, isto não é crime, mas não se pode agir inspirado por essa ideia nazista, e isto é crime".

"No final do dia, é sempre uma ponderação entre o que você considera mais nocivo. É mais nocivo tolher a possibilidadeo jogo de apostadeterminadas ideias circulem ou as ideias que se quer proibir são mais nocivas? Há três paradigmas. Nos EUA, entendeu-se que era mais nocivo o controleo jogo de apostaideias, mas bem mais ou menos, é só lembrar do que foi o macarthismo e a perseguição aos comunistas. Esse mercadoo jogo de apostaideias é livre, pero no mucho."

Inspiradoo jogo de apostapensadores como o filósofo britânico John Stuart Mill, o mercadoo jogo de apostaideias é o nome dado a um conceito jurídico americanoo jogo de apostauma livre circulaçãoo jogo de apostaideiaso jogo de apostaque quase nada é proibido (salvo raras exceções, como obscenidades e algo que gere perigo iminente ou atente contra a segurança nacional) e que as "melhores ideias" se sobressaem com a demanda no debate e as ruins desaparecem.

Gordon Baker considera esse conceito bastante perigoso. "Cass Sunstein, constitucionalista e professoro jogo de apostaHarvard, defende que mesmo o mercadoo jogo de apostasapato,o jogo de apostaxampu ouo jogo de apostasabão tem regulamento. Além disso, certas mentiras e questões conspiratórias acabam não morrendo, elas continuam. Na questão da verdade, eu acredito que deve haver um debate sim, distribuir o livro Minha Luta, do Hitler, com prefácio explicativo. Mas é preciso ter muito cuidado e responsabilidade ao se usar a liberdadeo jogo de apostaexpressão para tratar da maior crueldade e destruição da dignidade humana".

"Já tentamos um mercado livreo jogo de apostaideias antijudeu e sabe o que aconteceu? O Holocausto. Não há sociedade que permita liberdade irrestrita sem responsabilidade pelo dano a outrem", escreveu Amparo.

Para a jurista feminista americana Catharine MacKinnon, no último século, a discussão sobre liberdadeo jogo de apostaexpressão também acabou sendo usada como armao jogo de apostadebates políticos.

Segundo a especialista, ela deixouo jogo de apostaser "uma proteção para dissidentes, radicais, artistas, ativistas, socialistas, pacifistas e desvalidos para se tornar uma arma para autoritários, racistas, misóginos, nazistas, supremacistas, pornógrafos e corporações que compram eleições na surdina".

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