A tragédia na Romênia comunista que revelou à ciência os danos da negligência na infância:qual a melhor casa de apostas 2024

Esses estudos, agora, estão inspirando uma iniciativa para estimular crianças paulistanas.

Mas, antesqual a melhor casa de apostas 2024entrar nessa parte da história, é preciso entender como aqueles abrigos infantis romenos, que passaram décadas escondidos no pequeno país do Leste Europeu, ganharam as manchetes mundiais.

O fimqual a melhor casa de apostas 2024um regime totalitário

Em 1989, há exatos 30 anos, a Romênia teve um Natal peculiar. O ditador comunista Nicolae Ceausescu, líder do país havia um quartoqual a melhor casa de apostas 2024século, foi derrubadoqual a melhor casa de apostas 2024uma revolução relâmpago, que, alimentada por anosqual a melhor casa de apostas 2024escassezqual a melhor casa de apostas 2024produtos básicos e queda nas condiçõesqual a melhor casa de apostas 2024vida da população, começou quando o líder reagiu com brutalidade a manifestações populares.

Essas mesmas manifestações logo chegaram a Bucareste e, quando o Exército romeno aderiu aos protestos,qual a melhor casa de apostas 202422qual a melhor casa de apostas 2024dezembro, Ceausescu equal a melhor casa de apostas 2024mulher foram detidos. Naquele 25qual a melhor casa de apostas 2024dezembro, ele foi executado a tiros depoisqual a melhor casa de apostas 2024ser condenado às pressas por um tribunal militar especial.

Seu regime fora marcado por políticas linha-dura, inclusive uma voltada a reverter as baixas taxasqual a melhor casa de apostas 2024natalidade do país – a ideia eraqual a melhor casa de apostas 2024que aumentar a população fomentaria a economia e fortaleceria a Romênia.

Ainda no início do seu governo, nos anos 1960, Ceausescu implementou um decreto que restringia o aborto e o acesso a contraceptivos. "Quem evita ter filhos é um desertor que abandona as leisqual a melhor casa de apostas 2024continuidade nacional", declarou o ditadorqual a melhor casa de apostas 2024discurso.

Registros históricos apontam que o decreto pôsqual a melhor casa de apostas 2024prática um controle absoluto da vida reprodutiva feminina. Autoridades – que ficaram conhecidas como a "polícia menstrual" – submetiam mulheres a testes ginecológicos obrigatóriosqual a melhor casa de apostas 2024seus locaisqual a melhor casa de apostas 2024trabalho e monitoravam suas gestações. Casais que não procriassem tinhamqual a melhor casa de apostas 2024pagar impostos adicionais.

Como resultado, a taxaqual a melhor casa de apostas 2024natalidade romena cresceu com rapidez, mas com duros efeitos colaterais: um aumento nas taxasqual a melhor casa de apostas 2024mortalidade materna e infantil e, também, no númeroqual a melhor casa de apostas 2024crianças que acabavam abandonadas, aos milhares,qual a melhor casa de apostas 2024abrigos estatais.

À medida que o regimequal a melhor casa de apostas 2024Ceausescu se deteriorava, também pioravam as condições nesses abrigos: as crianças eram submetidas a abusos físicos, não eram devidamente limpas ou alimentadas, seus cuidadores eram mal preparados. As que saíramqual a melhor casa de apostas 2024lá contaram mais tarde que eram "tratadas como animais selvagens que precisavam ser enjaulados".

Além disso, passavam os dias sem nenhuma interação produtiva com adultos, sem brincar ou conversar, olhando para paredes ou deitadas sozinhasqual a melhor casa de apostas 2024seus berços,qual a melhor casa de apostas 2024onde só saíam para serem trocadas ou alimentadas. Muitas tinham (ou desenvolveram) problemas mentais.

Foi só depois daquele Natalqual a melhor casa de apostas 20241989 que, com a quedaqual a melhor casa de apostas 2024Ceausescu e a cobertura da imprensa sobre o país, a situação dessas dezenasqual a melhor casa de apostas 2024milharesqual a melhor casa de apostas 2024crianças veio a público e chocou o mundo.

"Essas crianças não são cuidadas, são contidas", disse uma reportagem da BBC dos anos 1990 sobre um orfanato romeno para crianças com deficiência. "(Elas ficam em) quartos escuros e imundos, com excrementos por todo lado. São crianças que precisam dos melhores cuidados, mas recebem os piores possíveis."

Ao longo dos anos 1990, algumas crianças acabaram adotadas por famílias estrangeiras, sobretudoqual a melhor casa de apostas 2024Reino Unido, Canadá e Estados Unidos, onde os relatos midiáticos sobre os abrigos causaram comoção. Outras permaneceram nos abrigos, sem ter para onde ir e ainda sob condições insatisfatórias.

É nessa parte da história que entra o americano Nathan Fox e outros colegas cientistas, chamados,qual a melhor casa de apostas 20242001, pelo novo governo romeno para avaliar os impactos que os abrigos tiveram na vida das crianças e buscar formasqual a melhor casa de apostas 2024intervir.

Marco nos estudosqual a melhor casa de apostas 2024desenvolvimento infantil

Nessa época, já havia estudos científicos indicando que adversidades e negligência vividas na infância impactavam o desenvolvimento e o comportamento das crianças.

"Mas, como não se pode colocar crianças nesse tipoqual a melhor casa de apostas 2024situação (para fins meramentequal a melhor casa de apostas 2024pesquisas), era difícil identificar a causalidade" entre a negligência e o desenvolvimento infantil, explica Fox à BBC News Brasil.

Em Bucareste, porém, o cenário para a pesquisa, infelizmente, estava dado. E as terríveis condições vividas pelas crianças romenas acabaram sendo um pontoqual a melhor casa de apostas 2024virada nas pesquisas sobre o cérebro infantil.

"Conseguimos examinar a causalidade e dizer, com alto grauqual a melhor casa de apostas 2024certeza, que a adversidade no início da vida tem impacto no cérebro. (...) Estímulos ou interação são cruciais para a arquitetura cerebral e, se não há uma mudançaqual a melhor casa de apostas 2024circunstâncias para essas crianças, esses efeitos podem perdurar para a vida toda. É um grande fardo para a sociedade."

Na prática, explicam os neurocientistas, desde o primeiro diaqual a melhor casa de apostas 2024vida as crianças precisam da interação com seus cuidadores como uma espéciequal a melhor casa de apostas 2024"nutriente" para seu cérebro: conversas, olhares, carinhos e brincadeiras são biologicamente essenciais, porque ajudam o cérebro infantil a construir redes neurais que mais tarde as ajudarão a se desenvolver emocionalmente e cognitivamente.

Em contrapartida, "na ausência da mediação do adulto, o sistemaqual a melhor casa de apostas 2024estresse da criança é ativado, e isso pode se tornar crônico", diz Fox.

Ou seja, quando as crianças sofrem violência, problemas socioeconômicos extremos, maus-tratos ou são radicalmente negligenciadas, o estresse tóxico decorrente disso impede o cérebroqual a melhor casa de apostas 2024realizar conexões neurais, o que pode levar a dificuldadesqual a melhor casa de apostas 2024aprendizado equal a melhor casa de apostas 2024comportamento.

Em estudos publicadosqual a melhor casa de apostas 20242003 e 2004, Fox e seus colegas analisaram eletroencefalogramasqual a melhor casa de apostas 2024crianças romenas institucionalizadas e compararam esses exames com osqual a melhor casa de apostas 2024crianças romenas que viviam com suas famílias.

As que haviam passado pelas condições extremas dos abrigos tinham um cérebro diferente das que tinham tido uma infância tradicional: frequência cerebral menorqual a melhor casa de apostas 2024áreas cruciais e imaturidade do sistema nervoso.

A vida pós-orfanato

As crianças que conseguiram ser adotadas tiveram mais sorte: Fox e seus colegas notaram que elas tinham um desenvolvimento cognitivo melhor do que as que não tinham podido deixar os abrigos romenos.

Mas algumas conviveram com os efeitos negativos dos abrigos até a vida adulta, segundo um estudo feitoqual a melhor casa de apostas 20242017 por outra equipequal a melhor casa de apostas 2024cientistas internacionais.

Eles acompanharam 165 crianças romenas adotadas no Reino Unido entre 1990 e 1992. Inicialmente, todas tinham atrasosqual a melhor casa de apostas 2024desenvolvimento e estavam subnutridas. As que passaram menosqual a melhor casa de apostas 2024seis meses nos abrigos apresentaram uma recuperação surpreendente ao chegarem aos 5 ou 6 anosqual a melhor casa de apostas 2024vida.

Já as que haviam passado períodos mais longos nos abrigos tinham mais problemas sociais, emocionais e cognitivos na vida adulta – desde dificuldadequal a melhor casa de apostas 2024se concentrar e arrumar emprego atéqual a melhor casa de apostas 2024se relacionar com os outros e maior propensão a problemas mentais.

Por isso, é importante tirar as crianças o mais rápido possívelqual a melhor casa de apostas 2024situaçõesqual a melhor casa de apostas 2024negligência e colocá-las sob os cuidadosqual a melhor casa de apostas 2024pessoas amorosas, disse à época à BBC um dos autores do estudo, Edmund Sonuga-Barke, da Universidade King's College,qual a melhor casa de apostas 2024Londres.

No geral, o economista brasileiro Flavio Cunha, que pesquisa desigualdade, pobreza e desenvolvimento infantil na Universidadequal a melhor casa de apostas 2024Rice, nos Estados Unidos – e que não tem relação com o estudo romeno –, afirma que as pesquisas sobre o país do Leste Europeu mostram que "se nós retirarmos uma criançaqual a melhor casa de apostas 2024um ambiente tão adverso e a colocarmosqual a melhor casa de apostas 2024um ambiente com uma família acolhedora, (...) melhoram o seu desenvolvimento sócioemocional, especialmente externalização (comportamento agressivo, desafiador, perturbador ou hiperativo); o seu desenvolvimentoqual a melhor casa de apostas 2024linguagem; e o seu controle inibitório (que é a capacidadequal a melhor casa de apostas 2024manter o autocontrolequal a melhor casa de apostas 2024situaçõesqual a melhor casa de apostas 2024estresse)".

"Todas essas três (melhoras) são muito importantes para o desenvolvimento futuro da criança", afirma Cunha à BBC News Brasil.

A negligência é 'tão grave quanto' o abuso

Enquanto abusos físicos contra crianças costumam gerar forte reação social, a negligência e a privação infantil tendem a ser menos perceptíveis – embora possam ter um efeito igualmente grave, diz o estudo A Ciência da Negligência,qual a melhor casa de apostas 20242012, feito pelo Centroqual a melhor casa de apostas 2024Desenvolvimento Infantil da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e coassinado por diversos neurocientistas, incluindo Nathan Fox.

"Muitas crianças pequenas identificadas pelo sistemaqual a melhor casa de apostas 2024proteção social (...) não têm evidênciasqual a melhor casa de apostas 2024danos físicos, mas podem ter tido perturbações no desenvolvimentoqual a melhor casa de apostas 2024seus circuitos cerebrais que podem ter sérias consequências pela vida inteira", aponta o texto, que descreve a negligência como "a ausênciaqual a melhor casa de apostas 2024atenção suficiente e da proteção que são apropriadas à idade e às necessidades das crianças" e a "ausênciaqual a melhor casa de apostas 2024quantidades suficientesqual a melhor casa de apostas 2024experiências essenciais para o bem-estar" infantil.

E essa negligência pode estar presente não apenasqual a melhor casa de apostas 2024abrigos, mas também, por exemplo,qual a melhor casa de apostas 2024laresqual a melhor casa de apostas 2024famílias social e economicamente marginalizadas, ou cujos pais sofremqual a melhor casa de apostas 2024problemas mentais não devidamente tratados. Por isso, é também a forma mais prevalentequal a melhor casa de apostas 2024maus-tratos contra crianças, aponta esse mesmo estudo.

"O mais comum é a negligência, nos Estados Unidos e imagino que tambémqual a melhor casa de apostas 2024outros lugares do mundo", prossegue Fox. "As crianças precisam estar sob os cuidadosqual a melhor casa de apostas 2024pessoas que as amem e que as façam se sentir seguras."

Pesquisadores apontam que crianças sob situações extremas, como as que são vítimasqual a melhor casa de apostas 2024guerras, violência urbana, migração forçada ou separação forçadaqual a melhor casa de apostas 2024seus pais, também podem ter seu desenvolvimento cerebral alterado, por estarem sob constante estresse.

Nos Estados Unidos, um caso que tem alimentado debates é oqual a melhor casa de apostas 2024crianças filhasqual a melhor casa de apostas 2024imigrantes irregulares que têm sido separadasqual a melhor casa de apostas 2024seus pais na fronteira e colocadasqual a melhor casa de apostas 2024centros provisóriosqual a melhor casa de apostas 2024detenção.

Em depoimento ao Congresso americano,qual a melhor casa de apostas 2024fevereiro, a um subcomitê da Câmara que investiga a políticaqual a melhor casa de apostas 2024separaçãoqual a melhor casa de apostas 2024famílias migrantes, o médico Jack Shonkoff, diretor do Centroqual a melhor casa de apostas 2024Desenvolvimento Infantilqual a melhor casa de apostas 2024Harvard, afirmou que "o estresse (em decorrência dessas separações) desencadeia uma enorme reação dentro das crianças. (...) Uma importante base para o desenvolvimento saudávelqual a melhor casa de apostas 2024crianças pequenas exige um relacionamento saudável, estável e compassivo com ao menos um dos pais ou cuidador primário. Níveisqual a melhor casa de apostas 2024estresse altos e persistentes podem perturbar a arquitetura do cérebro aindaqual a melhor casa de apostas 2024desenvolvimento".

Treinando cuidadores no Brasil

Agora, Fox e seus colegas preparam um projetoqual a melhor casa de apostas 2024São Paulo, para treinar,qual a melhor casa de apostas 20242020, cuidadores que possam dar atenção individualizada a crianças pequenas atualmente vivendoqual a melhor casa de apostas 2024abrigos da cidade (e, portanto, desprovidas do contato permanente com suas famílias).

Como a iniciativa ainda estáqual a melhor casa de apostas 2024fasequal a melhor casa de apostas 2024elaboração, Fox diz que não é possível dar mais detalhes sobre a metodologia e a prática, apenas afirma que deve incluir treinamentosqual a melhor casa de apostas 2024vídeo que expliquem a esses cuidadores o que os cientistas chamamqual a melhor casa de apostas 2024"saque e devolução" – que, à semelhançaqual a melhor casa de apostas 2024esportes como tênis e pingue-pongue, se refere ao ir e vir da interação produtiva entre crianças e adultos: o olhar, som ou falaqual a melhor casa de apostas 2024uma criança é o "saque", que o adulto devolve com outro olhar ou com alguma resposta.

Isso, explicam os pesquisadores do Centroqual a melhor casa de apostas 2024Desenvolvimento Infantilqual a melhor casa de apostas 2024Harvard, ajuda a literalmente construir redes neurais no cérebro, dando uma base mais sólida para o desenvolvimento acadêmico, emocional e social da criança ao longo da vida.

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social brasileiro, no projetoqual a melhor casa de apostas 2024Fox também será "analisada e comparada a qualidade do desenvolvimentoqual a melhor casa de apostas 2024criançasqual a melhor casa de apostas 2024instituições, como abrigos e orfanatos, equal a melhor casa de apostas 2024acolhimento familiar".

No país do Leste Europeu, a comoçãoqual a melhor casa de apostas 2024torno dos abrigos da era comunista fez com que autoridades proibissem que bebês e crianças pequenas ficassemqual a melhor casa de apostas 2024abrigos, deixando-as sob os cuidadosqual a melhor casa de apostas 2024famílias provisórias, diz Fox.

Ainda assim, muitas crianças mais velhas continuam vivendo com poucas perspectivasqual a melhor casa de apostas 2024adoção ouqual a melhor casa de apostas 2024melhores condiçõesqual a melhor casa de apostas 2024vida. "Crianças com deficiência ou problemasqual a melhor casa de apostas 2024nascença são as que têm menos chancequal a melhor casa de apostas 2024serem adotadas, e isso ainda é um grande problema lá", relata.

O que Fox diz ter aprendido com seus estudos (aindaqual a melhor casa de apostas 2024curso) na Romênia é que o cuidado individualizado e amoroso das crianças é a melhor formaqual a melhor casa de apostas 2024intervenção contra a negligência, e que essas intervenções têm mais chancequal a melhor casa de apostas 2024sucesso se ocorrerem cedo,qual a melhor casa de apostas 2024preferência antesqual a melhor casa de apostas 2024essas crianças completarem dois anos, quando seu cérebro apresenta o mais alto grauqual a melhor casa de apostas 2024plasticidade.

"É uma questão social que interessa a todos: como podemos dar apoio aos cuidadores, para que eles possam oferecer mais possibilidades às crianças", afirma.

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