Como uma imagem reacendeu um debate histórico sobre índios e religião:betfair casino online
- Vinicius Lemos
- De Cuiabá para a BBC Brasil

Foto publicada por pastor evangélico no Facebook viralizou e lhe rendeu muitas críticas | Foto: Arquivo Pessoal
betfair casino online Uma fotografia compartilhada pelo pastor evangélico Isac Santos no Facebook reacendeu uma discussão que perdura por séculos. Na publicação, feitabetfair casino online22betfair casino onlineagosto, o religioso aparece acompanhadobetfair casino onlinediversos xavantes no municípiobetfair casino onlineÁgua Boa,betfair casino onlineMato Grosso, e comemora o fatobetfair casino onlineter batizado 38 integrantes da aldeia, entre eles o cacique do grupo.
Na imagem publicada na rede social há homens, mulheres e uma criança, todos integrantes da terra indígenabetfair casino onlineAreões. Eles usam roupas brancas. Ao fundo, o pastor abre os braços e sorri.
A publicação viralizou - eram maisbetfair casino online16 mil reações e 10 mil compartilhamentos até a manhã desta segunda-feira - e teve repercussão,betfair casino onlinegrande parte, negativa. A maioria dos usuários utilizou o emoji que expressa raiva para classificar a fotografia. A segunda reação mais popular foi abetfair casino onlinetristeza.
Nos comentários, há diversas críticas ao batismo dos indígenas. "Eu peço que Deus iluminebetfair casino onlinecabeça e mostre como é irracional e até pecado o desrespeito à cultura indígena. Jesus não é isso", escreveu uma mulher,betfair casino onlinemeio a muitas outras pessoas que também reprovaram a atitude do pastor. Poucos comentários apoiaram a ação do religioso.
Além dos missionários, o batismo dos indígenas também teve a presença da vereadora Aninha Carvalho (SD), do municípiobetfair casino onlineTrindade,betfair casino onlineGoiás. Em suas redes sociais, a parlamentar publicou imagens dos xavantes e um vídeo no qual aparece ao lado do pastor cantando músicas religiosas para crianças indígenas. Ela também recebeu diversas críticas nos comentários.
O debate sobre a inserçãobetfair casino onlinereligiões à cultura dos indígenas é antigo. O assunto existe desde o Brasil Colônia, quando os jesuítas vieram ao país,betfair casino online1549, para evangelizar, catequizar e tornar cristãos os indígenas que habitavam as terras brasileiras.
Quase cinco séculos depois, o impacto cultural da religião do homem branco nos indígenas ainda gera debates e causa polêmica. Apesar disso, gruposbetfair casino onlinediversas religiões continuam frequentando tribos e conquistando novos fiéis dentro das aldeias.
Para o antropólogo Roque Lara, que há décadas estuda a cultura indígena, as incursões religiosas trazem prejuízo histórico para os indígenas.
"A Constituição brasileira garante aos indígenas o direitobetfair casino onlinecontinuar com suas crenças e religiões. Como antropólogo, há muito tempo tenho me manifestado contra missões. É um absurdo que uma pessoa que venhabetfair casino onlinefora, que não fala a língua do grupo, queira mudar a cabeça deles e as crençasbetfair casino onlinecentenasbetfair casino onlineanos."
O batismobetfair casino onlineÁgua Boa

Pastor argumenta que, antesbetfair casino onlinese converterem àbetfair casino onlinereligião evangélica, indígenas já haviam adquirido costumes 'brancos' | Foto: Arquivo Pessoal
O pastor Isac Santos, da Igreja Tempobetfair casino onlineSemear, contou que há maisbetfair casino onlineum ano conhece o cacique da aldeia onde ocorreu o batismo. Segundo o religioso, os xavantes da região sempre ficam embetfair casino onlinecasa quando vão à cidade. Ele argumentou que antesbetfair casino onlinese converterem àbetfair casino onlinereligião, os indígenas já haviam adquirido costumes brancos.
"Eles eram convertidos ao cristianismo. Ao contrário do que os ignorantes pensam, a aldeia deles possui energia e televisão. Além disso, os indígenas daquela região têm conta no banco, títulobetfair casino onlineeleitor, Bolsa Família, falam português e fazem faculdade. Eles não ficam dançando ao redor do fogo o dia todo", disse.
Santos comentou que o batizado foi presenciado por todos os membros da aldeia, incluindo os que não participaram do ato.
A cerimônia ocorreu no Rio Borecaia,betfair casino onlineÁgua Boa. Os indígenas foram ao local com os missionários. Utilizando roupas brancas, eles entraram na água junto com os religiosos. Entoavam cantobetfair casino onlinesua cultura,betfair casino onlinelinguagem própria, enquanto os pastores bradavam "aleluia, Jesus" e "glória a Deus".
Durante o batismo, havia duas duplasbetfair casino onlinepastores e cada uma delas convidava um indígena por vez. Ao ser chamado, cada um era posicionado pelos religiosos. De costas, eles juntavam as palmas das mãosbetfair casino onlinesinalbetfair casino onlineoração e eram colocados durante segundos nas águas do rio. Posteriormente, eram levantados e recebiam aplausosbetfair casino onlinequem acompanhava a cerimônia.
De acordo com Santos, o batizado é essencial para os indígenas que queiram seguir a religião evangélica. "Sebetfair casino onlinefato são cristãos, essa decisão precisa ser selada no batismo. Segundo João Batista, isso é feito por imersão nas águas. É preciso crer para ser batizado. Só dei continuidade ao batismo quando pude testificar,betfair casino onlinefato, que eles tinham Jesus como salvador. Caso contrário, o procedimento deles seria inválido."
Ele frisou que os indígenasbetfair casino onlineAreões foram os únicos batizados pela equipe missionária da qual faz parte. O religioso também salientou que as roupas utilizadas durante a cerimônia não foram exigências e pertenciam a eles, que teriam comprado as vestes para utilizá-lasbetfair casino onlinedias festivos.

Contato entre religiosos e indígenas é polêmico | Foto: Arquivo Pessoal
Em relação às diversas críticas que recebeu, o religioso as classificou como infundadas. Para ele, os comentários contrários ao batismo foram feitos por "ativistasbetfair casino onlineteclado".
"Fazer dos indígenas uma bandeirabetfair casino onlineativismo é muito bizarro. Os tratam como bichos, como se fossem incapazes. Os indígenas dizem que podem tomar suas próprias decisões. Eles escolheram a nossa fé. Parece que é crime o fatobetfair casino onlineeles terem escolhido o cristianismo."
Santos comentou que reagiu com naturalidade aos comentários negativos feitos embetfair casino onlinepublicação.
"No meu Facebook, comenta quem quer. Na minha caixabetfair casino onlinemensagem há todo tipobetfair casino onlineameaça. Mas não é disso que se trata a democracia? Eles xingam quem eles querem, eu batizo quem quiser ser batizado", afirmou.
Sobre a presença da vereadora Aninha Carvalho na cerimônia, o líder religioso explicou que a parlamentar estava a passeio. "Ela foi para pescar com a gente no rio das Mortes. Como descemos para a aldeia, ela nos acompanhou e ainda comprou pães para o lanche e docinhos para as crianças indígenas. Acabou sendo uma bênção."
A reportagem entroubetfair casino onlinecontato com a assessoriabetfair casino onlineimprensa da vereadora e com a própria parlamentar, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.
Contato entre tribos e religiosos
O controlebetfair casino onlineacessobetfair casino onlinegrupos religiosos a tribos indígenas é feito pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
Por meiobetfair casino onlinecomunicado, a instituição explicou que a entradabetfair casino onlinemissõesbetfair casino onlineterras indígenas só pode ocorrer com autorização da presidência do órgão oubetfair casino onlinecasobetfair casino onlineas lideranças das aldeias autorizarem a entrada dos grupos.
A Funai informou ainda que não recebeu nenhum tipobetfair casino onlinedenúncia sobre o casobetfair casino onlineÁgua Boa.
Já no Ministério Público Federal (MPF) existe uma representação contra o batismo que ocorreu na terra indígenabetfair casino onlineAreões. Em 28betfair casino onlineagosto, a pedagoga Juliani Caldeira protocolou denúncia sobre o caso após ver a publicação feita pelo pastor Isac Santos. O procedimento ainda não entroubetfair casino onlinefasebetfair casino onlinetramitação.
Na denúncia, Caldeira questionou a presença da vereadora Aninha Araújo e dos missionários na aldeia. Ela pediu a aberturabetfair casino onlineinvestigação sobre o caso.
"Sendo o Estado Laico e sendo a vereadora representante do povo no seu mandato, teria ela o consentimento para entrarbetfair casino onlinealdeias, levando abetfair casino onlinecultura para um grupo que já possui abetfair casino onlineprópria?", questionou a pedagoga,betfair casino onlinetrecho do documento protocolado no Procuradoria.
Cultura
Os xavantes compõem o maior grupo indígenabetfair casino onlineMato Grosso. Há cercabetfair casino online20 mil delesbetfair casino onlinediversas regiões mato-grossenses. Eles possuem dez terras no Estado.
Entre as características culturais deles estão rituais que envolvem os processos da vida como nascimento e casamento. Os indígenas desse grupo são ligados a questõesbetfair casino onlineespiritualidade e cultivam segredos sobrenaturais. A língua deles é denominada acuen, do tronco linguístico macro-jê.
Entre seus rituais, destaca-se o wai'a, no qual apenas os homens participam e repassam conhecimentos tidos como sobrenaturais, relacionados a questões como a vida e a morte, o bem e o mal, a doença e a cura.
Uma das particularidades dos xavantes é a permissão para que os homens possam exercer a poligamia.
Nas últimas décadas, assim como relatadobetfair casino onlineoutras aldeias do país, parte da cultura deles foi suplantada pela religião evangélica ou católica, trazida aos grupos por meiobetfair casino onlinemissionários.
Diversas terrasbetfair casino onlinexavantes deixarambetfair casino onlinepermitir a poligamia e outros ritos, mantiveram alguns costumesbetfair casino onlineseus ancestrais e passaram a ser predominantemente católicas ou evangélicas.
O xavante Lúcio Waane Terowaa,betfair casino online39 anos, que vive na terra indígenabetfair casino onlineSão Marcos, teme pela perda culturalbetfair casino onlineseu povo. Filhobetfair casino onlinepais que decidiram seguir o catolicismo, ele nunca quis ser batizado e optou por preservar a culturabetfair casino onlineseus antepassados.

Indigenista Ivar Busatto diz que a posturabetfair casino onlinealguns religiosos assusta pessoas que trabalham com a cultura indígena | Foto: Arquivo Pessoal
"Nós acreditamos na espiritualidade indígena. Os xavantes creem que existe o mundo espiritual, que nos protege, nos leva a ser pessoas mais tranquilas e faz com que tenhamos convivência harmônica. Só que essas pessoas que estão mais avançadasbetfair casino onlineoutras religiões estão falando mal da nossa. Dizem que a deles está certa. Isso é muito triste", disse.
"As nossas crenças foram atacadas pela Igreja Católica e pela evangélica. Começaram a falar que não é certo dar continuidade à nossa religião. Isso vem trazendo um grande impacto sociocultural", completou.
Segundo ele, apesarbetfair casino onlinediversos grupos terem adotado religiões diferentes, há outros que nunca aceitaram a presençabetfair casino onlinenenhum tipobetfair casino onlineigreja.
"Ao longo dos anos, algumas aldeias foram convencidas, mas nem todas. Algumas delas não aceitam nenhum missionário e mantêm a tradição antiga", relatou.
Terowaa contou que quase chegou a ser batizado, mas desistiu. "Comecei a pesquisar sobre religião, procurei na internet e percebi que havia algo errado que está dominando meu povo."
"Na minha opinião, acho que todas as religiões merecem respeito. É triste ver que a igreja invadiu nosso território para evangelizar os indígenas e agora fala mal da nossa cultura. Para mim, não há fundamento para justificar a existência dessas religiões nas aldeias."
Incursões religiosas

Com 20 mil integrantes, xavantes formam o maior grupo indígenabetfair casino onlineMato Grosso
As ações religiosasbetfair casino onlineterras indígenasbetfair casino onlineMato Grosso possuem diversas passagens marcantes. Entre elas está a missão jesuíticabetfair casino onlineUtiariti, feita por membros da Igreja Católica no municípiobetfair casino onlineDiamantino entre os anosbetfair casino online1930 a 1970. O trabalho envolveu os Nambikwara, Irantxe, Paresi, Rikbáktsa, Apiaká e os Kayabi.
A Utiariti tinha o objetivobetfair casino onlinecatequizar crianças indígenas por acreditar que elas seriam o meio mais fácilbetfair casino onlinedoutrinaçãobetfair casino onlineum períodobetfair casino onlineque havia disputabetfair casino onlineterras entre indígenas e seringueiros. Na época, ocorria a reativaçãobetfair casino onlineseringaisbetfair casino onlineMato Grosso, após a Segunda Guerra Mundial.
A missão foi alvobetfair casino onlineduras críticasbetfair casino onlineindígenas, pois no internato onde as crianças ficavam havia distanciamento da cultura nativa delas. No local, os responsáveis somente conversavambetfair casino onlineportuguês, passavam apenas ensinamentos católicos e eram raras as permissões para que os pequenos indígenas pudessem visitar suas famílias.
O indigenista Ivar Busatto, coordenador da Operação Amazônia Nativa (Opan), comentou que a posturabetfair casino onlinealguns religiosos assusta pessoas que trabalham com a cultura indígena.
"A gente tem visto na Amazônia, no Sul do País ebetfair casino onlineoutros lugares, que há uma 'busca' por essas almas dos nativos, que é um pouco estranha e agressiva. Isso tem nos preocupado. Esse ufanismo por conquistabetfair casino onlinealmas é estranho e causa perplexidade."
Ele relatou que cada indígena tem permissão para seguir a religião que preferir, conforme determina a Constituição Federalbetfair casino online1988. Porém, frisou que é importante manter o apreço à culturabetfair casino onlinecada povo.
"Todo cidadão,betfair casino onlinequalquer etnia,betfair casino onlinequalquer lugar do mundo, tem o direitobetfair casino onlinefazer suas escolhasbetfair casino onlinelinha religiosa. Mas é importante ter respeito às crençasbetfair casino onlinecada um", observou.
O antropólogo Roque Lara pontuou que o modo como os missionários agem pode ofender a cultura das aldeias.
"A Constituição diz que a crença dos indígenas deve ser respeitada. O indígena, individualmente, pode mudarbetfair casino onlinecrença, caso queira. Mas o problema é a maneira como as coisas são feitas. Depende do modo como missionário está agindo. Ele pode começar a oferecer bens materiais e o indivíduo acha que é vantagem."
"Mas, por princípio, os antropólogos defendem as crenças indígenas, da mesma forma que defende que cada um tenha abetfair casino onlinecrença e também o direitobetfair casino onlinenão ter nenhuma", completou.

Funai diz que missões religiosas só entrambetfair casino onlineterras indígenas se autorizadas pelo órgão ou por lideranças das aldeias | Foto: Reprodução
Lara defendeu que os grupos religiosos que comparecem às aldeias realizem trabalhos sociais, sem coagir os indígenas a seguir determinada crença.
"Há muitos casosbetfair casino onlinereligiosos que desistiram da catequese e passaram a fazer serviçobetfair casino onlineassistência. Conheci missionário muito bem intencionado, que trabalhava bem e cuidou da população indígena. Mas acho que é importante saber o momentobetfair casino onlineque ele pode entrar e respeitar", destacou.
Uma das entidades religiosas que atuabetfair casino onlinealdeias indígenas do Brasil é o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), fundadobetfair casino online1972. A instituição é ligada à igreja católica por meio da Conferencia Nacional Dos Bispos do Brasil (CNBB) e afirma não impor nenhuma crença ao grupo.
O secretário-executivo do Cimi, Cleber Buzzato, esclareceu que o conselho tem o objetivobetfair casino onlineauxiliar causas relacionadas aos indígenas.
"Embora sejamos uma entidadebetfair casino onlinecaráter religioso, nossa atuação junto aos povos não tem perfil proselitista. Defendemos termos constitucionais, segundo os quais os povos têm direito aos seus usos, costumes, tradições e terras que ocupam. A gente apoia esses povos nas demandas que eles apresentam ao Estado brasileiro, para que possam ter condições mais adequadasbetfair casino onlinevida", disse.
Ele comentou que ações religiosas do Cimi são realizadas apenas nas aldeiasbetfair casino onlinecasobetfair casino onlineos próprios indígenas solicitarem.
"Há casos específicosbetfair casino onlineque os povos passaram por processobetfair casino onlinecristianização e que demandam alguns serviços eclesiais. Se há solicitação dos povos e algunsbetfair casino onlinenossos voluntários têm a possibilidadebetfair casino onlineresponder a esses pedidos, então essas demandas são atendidas."
Apesarbetfair casino onlineacreditar que existam entidades religiosas que possam trazer benefícios aos indígenas e não imponham suas crenças ao grupo, o xavante Lúcio Waane Terowaa fez um apelo.
"Para que a gente possa viver neste mundo, cada um deve respeitar o outro. Cada raiz é diferente. Cada cor é diferente. Mas somos todos iguais, somos feitos à imagem única dos seres sábios. Eu preciso que as pessoas ao menos respeitem a gente."






