'Vi famílias dizimadas': relatos dramáticos da pandemia que deixou 400 mil mortos no Brasil:esport bete

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Despedidas, mortes por faltaesport beterecursos básicos e óbitosesport betediferentes integrantes da mesma família são algumas das situações que marcam os trabalhadores na linhaesport betefrente.
"É o pior período para a saúde mental dos profissionaisesport betesaúde. Muitos médicos pararamesport betedar plantão ou diminuíram o ritmoesport betetrabalho porque estavam muito estressados. Tem sido um período muito grandeesport beteestresse", relata o médico intensivista José Albaniesport beteCarvalho.
Os profissionaisesport betesaúde relatam que cenas difíceisesport beteserem esquecidas se tornaram cada vez mais comunsesport betemeio à pandemia. Para dimensionar a tragédia vivida no paísesport bete400 mil mortes pela doença, a BBC News Brasil pediu para médicos relatarem algumas das situações mais dramáticas que presenciaram desde o ano passado.
'Vimos um paciente morrer atrás do outro'

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O médico cirurgião Pierre Oliva Souza nunca esquecerá as cenas que presenciou no plantão que começou da noiteesport bete14esport betejaneiro até o dia seguinte,esport beteuma unidadeesport betesaúdeesport beteManaus, no Amazonas.
Ele chegou para o plantão no Serviçoesport betePronto Atendimento (SPA) Joventina Dias por volta das 19h. Na unidade, logo foi informado por um colega que não havia estoqueesport beteoxigênio medicinal — item fundamental para auxiliar pacientes com dificuldades respiratórias, como aqueles com quadro graveesport betecovid-19.
"Havia apenas dois cilindrosesport beteoxigênio, que durariam por algumas horas somente, porque a unidade estava lotada. Normalmente, havia 20 pacientes com suspeitaesport betecovid-19 que precisavam desse oxigênio, mas naquele período tinha maisesport bete40", relata o médico.
Ele conta que alguns gestores da região falaram que logo chegaria um caminhão carregado com oxigênio. "Deram falsas esperanças, porque isso não era verdade. Não havia oxigênioesport betelugar nenhumesport beteManaus, porque também faltou no mesmo diaesport beteoutras dezenasesport beteunidades do Amazonas", comenta.
Na madrugadaesport bete15esport betejaneiro, o oxigênio acabou completamente no SPA Joventina Dias. "Ninguém tinha avisado, dias antes, que o estoqueesport beteoxigênio estava acabando no Estado. Foi muito chocante para todo mundo", diz Souza.
"A gente sabia o quanto essa faltaesport beteoxigênio seria danosa e grave. O governador chegou a comentar, na semana anterior, que o Estado estava à beiraesport beteuma criseesport beteoxigênio, por causa do aumentoesport betecasosesport betecovid-19. Mas nós, profissionaisesport betesaúde, não tínhamos noçãoesport betecomo,esport betefato, a situação estava", diz o médico.
"Por causa da faltaesport beteoxigênio, a equipeesport betesaúde teve que assumir a difícil decisãoesport betequem vai sobreviver ou morrer por conta da absoluta faltaesport beteestrutura. Vimos um paciente morrer atrás do outro naquela madrugada. Eles definhavam, buscavam respirar, ficavam com a coloração azulada e morriam asfixiados na nossa frente. Não tínhamos o que fazer", relata Souza.
Segundo Souza, somente no SPA Joventina Dias foram contabilizadas oito mortes naquela madrugada. O médico relata que, normalmente, havia duas ou três mortes por plantão. "Seiesport betelugar que registrou maisesport bete20 mortes por causa da faltaesport beteoxigênio", comenta.
A situação no Amazonas se tornou notíciaesport betetodo o mundo. Diversos pacientes foram transferidos para outros Estados. Posteriormente, a cidade recebeu abastecimentosesport beteoxigênio. "A situação foi normalizada depois. Hoje as coisas estão bem, principalmente porque os númerosesport beteinternações caíram nas últimas semanas", diz o médico.
Apurações apontam que a faltaesport beteoxigênio causou dezenasesport betemortes no Amazonasesport betemeadosesport betejaneiro.
Então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello afirmou, na época, que foi avisado por voltaesport bete8esport betejaneiro que o alto númeroesport beteinternaçõesesport beteManaus até quintuplicou o uso do oxigênio medicinal. Em razão disso, segundo ele, o Ministério da Saúde logo passou a tomar providências junto com o governo estadual e a prefeitura.
De acordo com a CNN Brasil, o secretárioesport beteSaúde do Amazonas, Marcellus Campelo, alegou,esport betedepoimento à Polícia Federal que a faltaesport beteoxigênio ocorreu porque a principal fornecedora do insumo no Estado informou somente dias antes que não teria capacidadeesport beteatender a demanda na região,esport beterazão do aumentoesport beteinternações.
Segundo o secretário, o governo local logo comunicou o Ministério da Saúde e foram adotadas todas as medidas necessárias para o "enfrentamentoesport beteuma criseesport betesaúde sem precedentes na história do Amazonas".
Em meadosesport beteabril, o Ministério Público Federal (MPF) do Amazonas apresentou uma açãoesport beteimprobidade administrativa por omissão sobre a crise no fornecimentoesport beteoxigênio medicinal no Amazonas. Entre os alvos do procedimento estão três secretários do Ministério da Saúde e o então responsável pela pasta, general Eduardo Pazuello, e dois integrantes do governo do Amazonas, entre eles o secretário estadualesport beteSaúde, Marcellus Campelo.
O MPF apontou falhas como omissão no monitoramento da demandaesport beteoxigênio medicinal e adoçãoesport betemedidas para evitar o desabastecimento, alémesport betedemora nas transferênciasesport betepacientes para outros Estados. O caso segue na Justiça Federal do Amazonas.
Maisesport betetrês meses depois, as cenasesport betemeadosesport betejaneiro agora fazem parte das piores lembranças da pandemia para os profissionaisesport betesaúde do Amazonas.
"Eu vou superar, porque nosso trabalho pede, mas não vou esquecer nunca. Apesaresport betetodo ensinamento que tivemos na faculdade, nunca pensei que fosse viveresport betetemposesport betepaz aquilo que só acontece na guerra, que é escolher quem vai viver ou morrer", desabafa Souza.
'Vi famílias dizimadas'
O médico intensivista José Albaniesport beteCarvalho, que atuaesport beteUnidadesesport beteTerapia Intensiva (UTIs)esport betehospitais da grande São Paulo, comenta que algumas das situações mais tristes que presenciou envolvem as mortesesport betemembrosesport beteuma mesma família pela covid-19.
"Ver famílias inteiras morrendo foi uma das coisas que mais me marcaram. Não foi uma, nem duas, nem três. Foram vários casosesport beteirmãos, pais e filhos ou outros parentes morrendo com diferençasesport betehoras ou dias. A grande verdade é que na minha vida inteira nunca tinha visto isso tão frequentemente", desabafa o médico, que trabalhaesport beteUTIs há maisesport bete30 anos.
"Teve uma famíliaesport beteque morreram três irmãosesport betedois dias. Dois deles estavamesport beteleitos próximos. Isso impacta muito, porque você vê uma família ser dizimada", diz o médico.
Ele detalha o casoesport betetrês mortesesport betepessoas na faixa dos 40 anos que eram da mesma família. "O rapaz foi intubado com covid-19. A mulher dele foi internada, mas parecia que evoluiria bem e não precisaria ser intubada. Mas é muito difícil saber, porque às vezes um paciente demora 10 dias na UTI e você não sabe para onde ele vai, se vai melhorar ou piorar", comenta Albani.
"O rapaz acabou morrendo. A mulher dele, que a gente achava que daria altaesport betepoucos dias, piorou também e foi intubada. Dias depois, ela morreu. Depois, a irmã dela, que estava internada no hospital, também faleceu", relata o médico.
O intensivista foi o responsável por contar sobre as mortes à família. "Nunca é fácil comunicar isso, porque você acompanha essas famílias e aquele sofrimento durante as internações, que muitas vezes duram dias ou semanas", diz.
"Por incrível que pareça, esse comunicado para as famílias acaba sendo algo que a gente se acostuma. Não é ser insensível, mas é que há maisesport bete30 anos na UTI isso acaba se tornando algo do cotidiano. Mas claro, quando você vai comunicar três mortes para uma mesma família, como tem acontecidoesport betealguns casos, é mais difícil", acrescenta Albani.
O médico comenta que os familiares dos pacientes sempre reconhecem o trabalho dos profissionaisesport betesaúde.
Enquanto precisam enfrentar númerosesport beteinternações e mortes como nunca tinham presenciadoesport beteperíodo recente, os profissionaisesport betesaúde também enfrentam o estresse causado pela faltaesport betecuidadosesport betemuitosesport beterelação ao coronavírus.
"Do pontoesport betevista da sociedadeesport betegeral os profissionaisesport betesaúde não são reconhecidos. Enquanto vemos as dificuldades, as mortes e trabalhamos sob muito estresse, há muitas pessoas nas ruas que falam que máscara é bobagem e fazem aglomerações. Olhar essas situações causa ainda mais estresse a esses profissionais", desabafa Albani.
'Ficamos com medoesport betedar a notícia da morte da esposa'

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Para a médica Luisa Frota Chebabo, um dos momentos mais tristes da pandemia envolveu uma família completamente afetada pela covid-19. Ela conta que foram internados mãe, pai e filho no mesmo diaesport beteum mesmo hospital público da capital do Rioesport beteJaneiro,esport betenovembro passado.
"A mãe (de 60 anos) chegou muito grave e foi intubada no momento da admissão (no hospital). O pai e o filho estavam um pouco mais estáveis", diz Luisa.
Ela comenta que os leitosesport betecovid-19 estavam sobrecarregados na unidadeesport betesaúde, por isso os três integrantes da mesma família tiveramesport beteficar na áreaesport beteemergência.
"O filho foi mantidoesport beteobservação, sem precisaresport beteoxigênio suplementar. O pai necessitou do oxigênio. Os dois ficaram ao lado da mãe, intubadaesport beteestado grave", detalha a médica.
Luisa conta que o pai, que tinha 62 anos, dizia para todos os médicos que o filho havia frequentado festas e transmitiu a covid-19 para a família.
No dia seguinte à internação, o pai foi internadoesport beteum leito que ficou vago na enfermariaesport betecovid-19. O filho, por volta dos 30 anos, se recuperou e logo teve alta hospitalar. A mãe continuavaesport beteestado grave na emergência.
"O pai foi internado com piora progressiva. Todos os dias, ele perguntava pela esposa, que também estava piorando cada vez mais", detalha a médica.
Dois dias após chegar na unidadeesport betesaúde, a mãe da família morreu. "O marido dela, cada vez mais precisandoesport betesuplementaçãoesport beteoxigênio, continuava perguntando pela esposa", diz Luisa.
"A gente falava para ele que não tinha como ver muitos detalhes sobre ela, já que estava internadaesport beteoutro setor. Mas a gente falava que ela continuava intubada, mesmo após a morte dela", relata a médica.
"Esse paciente era bem ansioso, então ficamos com medoesport betedar a notícia do falecimento e precipitar uma descompensação da parte respiratória. A própria família falou que era melhor não dar a notícia enquanto ele não melhorasse, por causa desse componenteesport beteansiedade importante", diz Luisa.
A equipe médica optou por informar sobre a morte da companheira somente quando o homem apresentasse melhora clínica. Cinco dias após o falecimento da esposa, ele foi intubado. Três dias depois, morreu. "Somente o filho ficou bem", diz Luisa.
A médica comenta que histórias como a da família que ela acompanhouesport betenovembro demonstram a gravidade da covid-19esport betecomparação a outras enfermidades. "Nenhuma outra doença tinha esse agravanteesport betemuitas pessoas da mesma família morrendo juntas. Os casos são impactantes", diz a médica.
Jovens internados

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O cardiologista Roberto Kalil, que está há maisesport betetrês décadas na Medicina, não tem dúvidasesport beteque tem vivido o período mais dramáticoesport betesua carreira.
"O que impacta é a agressividade do vírus, que até então (antes do início da pandemia) era algo inesperado. É uma agressividade tanto na fase hospitalar como até,esport betealguns casos, depois da alta", relata o médico, que atuaesport betehospitaisesport beteSão Paulo.
Uma das situações que mais impactaram Kalil foi quando notou, neste ano, a explosãoesport betecasosesport betecovid-19 e a gravidade que a doença passou a ter também entre muitos pacientes mais jovens, que foram parar na UTI ou até morreram.
"No ano passado, a gente via pessoas mais velhas na UTI. Agora vemos muitos jovens. Muita gente fica grave rapidamente", diz à BBC News Brasil.
Ele comenta que o agravamento do quadro entre os mais jovens éesport beterazão da variante P.1, descobertaesport betejaneiroesport beteManaus. A maior incidência entre os mais novos é uma das características associadas à nova variante.
A maioria dos casos registradosesport bete2021esport beteSão Paulo, por exemplo, se concentra entre pessoasesport bete20 a 54 anos. Na Grande São Paulo, dados do inícioesport betemarço mostraram que 80% dos pacientes haviam sido infectados pela P.1.
Dados do governo paulista apontam que na primeira onda da pandemia maisesport bete80% dos leitos UTIs eram ocupados por idosos e portadoresesport betedoenças crônicas. Agora, 60% das vagas são ocupadas por pessoasesport bete30 a 50 anos, a maioria sem doença prévia.
Essa variante do coronavírus é mais contagiosa, entre outros motivos, por causaesport betemutações que facilitaram a invasãoesport betecélulas humanas. Essa característica pode estar ligada a duas hipóteses que estão próximasesport beteserem confirmadas por cientistas: agravamento mais rápido do quadroesport betesaúde e maior letalidade.
Conforme mostradoesport betereportagem da BBC News Brasilesport bete19esport beteabril, uma das principais hipóteses para que a nova variante afete duramente os mais jovens é a busca tardia por atendimento, quando a doença está bastante agravada, muitas vezesesport beteforma silenciosa.
Um dos principais benefícios da busca por atendimento antecipado é o uso do oxigênio medicinal, que pode ajudar a evitar um maior comprometimento dos pulmões. Além disso, o acompanhamento médico logo nos primeiros sintomas pode evitar maiores complicaçõesesport beteoutros órgãos.
Para o cardiologista Roberto Kalil, o cenário da pandemia no Brasil pode melhorar, aos poucos, com a vacinação. Porém, diante da faltaesport beteprazo para o avanço da imunização, que ainda está na fase dos grupos prioritários, ele avalia que os trabalhadores na linhaesport betefrente ainda devem enfrentar muito estresseesport betedecorrência da sobrecarga no sistemaesport betesaúde.
"Espero que o cenário melhore a cada semana, mas ainda estamos longeesport betesair da pandemia', diz Kalil.
A pediatraesport beteestado grave

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Entre as histórias que acompanhou desde o início da pandemia, o médico Lucas Antony se recorda do casoesport beteuma pediatra aposentada que foi internada com a covid-19esport betejaneiro deste ano.
A idosa,esport bete85 anos, chegou ao hospital particular, na capital Rioesport beteJaneiro, com dificuldades respiratórias. "Ela foi internada e usamos uma máscaraesport beteventilação não-invasiva nela. Mas a paciente não estava respondendo bem. Ela, como médica, também percebeu que não estava evoluindo bem", diz Antony.
O quadro da aposentada se agravou e ela precisou ser intubada no dia seguinte à chegada ao hospital. Antony afirma que a situação se tornou mais difícil por se trataresport beteuma paciente que era médica e sabia da gravidadeesport beteseu próprio quadro.
"Ela estava falando com a gente com a máscaraesport beteoxigênio e debatendo o caso dela quando informamos que ela precisaria ser intubada. Em certo momento, ela parouesport betefalar, ficou olhando para frente e disse que só queria ir para casa", relembra o médico.
Enquanto era intubada, a pediatra reparouesport beteuma enfermeira que a auxiliou. "Ela perguntou se a enfermeira já havia sido, na infância, atendidaesport beteum determinado serviço médico. A enfermeira disse que não que ela soubesse, mas a pediatra falou que lembrava dela", relata Antony.
Horas após a pediatra ser intubada, a enfermeira entrouesport betecontato com a mãe. "A mãe da enfermeira disse que ela levava a filha para ser atendida naquele serviço (citado pela médica aposentada) na infância. Então, provavelmente essa pediatra atendeu a enfermeiraesport betealgum momento", conta o médico.
Dois dias após ser intubada, a pediatra aposentada não resistiu às complicações da covid-19. O médico relata que ficou comovido com o caso da paciente por ser uma médica que sabia que não resistiria à doença e pela lembrança que ela teve da enfermeira. "Foi uma história que me marcou", diz.

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