Tênis Vert: como CLT e agroecologia viraram propaganda do 'made in Brazil' na Europa:triton poker

Duas décadas depois, a marca da dupla - batizadatriton pokerVeja no exterior e vendida como Vert no Brasil - produz 4 milhõestriton pokercalçados por ano. São quatro fábricas parceiras, duas no Rio Grande do Sul, duas no Ceará. A borracha vem da Amazônia; o algodão, do Nordeste; o couro, do Sul.

'Fairly made in Brazil'

O Brasil não costuma ser a primeira opçãotriton pokermarcastriton pokercalçados que querem produzir para o mundo. Uma das razões é o custo da mãotriton pokerobra, mais caro do quetriton pokerpaíses como China e Vietnã, que se tornaram grandes fabricantes globais do setor. Além dos salários mais altos, a legislação trabalhista,triton pokerforma geral, confere um grautriton pokerproteção maior do que na Ásia - o que geralmente também significa custos maiores.

Em uma épocatriton pokerque consumidores olham cada vez mais para valores como sustentabilidade, contudo, são características como essas que têm atraído algumas marcas para o país e repaginado o valor do "made in Brazil".

O caso da brasileira Undo For Tomorrow é exemplar nesse sentido. Depoistriton pokeralguns meses operando no Brasil, a empresatriton pokercalçados se lançou no mercado europeutriton pokerjunhotriton poker2021 com um crowdfunding (financiamento coletivo)triton pokerque apresentava um tênis feito com borracha da Amazônia, garrafas recicladas e balõestriton pokerfesta descartados, entre outros materiais.

No vídeotriton pokerapresentação, o narrador destaca: "Nuven is sustainable, vegan-friendly and fairly made in Brazil." (Nuven é sustentável, vegan-friendly e feitotriton pokerforma justa no Brasil,triton pokertradução literal)

Na pré-venda, a marca conseguiu arrecadar 110 mil eurostriton pokerum mês e meio. Hoje, as vendas para o mercado europeu respondem por algo entre 60% e 65% da receita total.

"Existe um valor maior por trás disso - e acho que aqui na Europa isso é muito reconhecido", diz Patrick Dohmann, que moratriton pokerPortugal e é fundador da marca, referindo-se ao fatotriton pokerproduzir no Brasil.

Formadotriton pokerdesign, o carioca cresceu no mundo do calçado. Trabalhou no negócio do pai, que foi dono da marca Andarella, com dezenastriton pokerlojas no país, e empreendeu no setor antestriton pokerse voltar para a sustentabilidade.

Jornadatriton poker8 horas e acesso à Justiça

A fábrica que produz para a marca está localizada no polo calçadistatriton pokerFranca,triton pokerSão Paulo. É chefiada por uma mulher e, segundo Dohmann, tem muitos empregados com longo tempotriton pokercasa, uma combinação que contribui para que o ambiente seja "quase familiar".

O Brasil é, para o empresário, um lugar onde a atmosfera do localtriton pokertrabalho e as condições físicas das unidades fabris têm um equilíbrio positivotriton pokerforma geral. Após ter conhecido maistriton poker30 fábricas, ele diz que, embora a estrutura "nem sempre seja a melhor", predomina "um ar muito amigável entre as pessoas".

Não foi essa a impressão que ele teve das fábricas do Vietnã. O país asiático tem ganhado protagonismo no setor calçadista nos últimos anos, à medidatriton pokerque o custo da mãotriton pokerobra aumenta na China, com a expansão da indústriatriton pokertecnologia no país.

Depoistriton pokerter visitado cercatriton poker15 fábricas vietnamitas, entre unidadestriton pokerpequeno, médio e grande porte, Dohmann saiu com a impressãotriton pokerque muitas das grandes fábricas têm boa estrutura, são "grandes e bem iluminadas", mas que o balanço entre trabalho e qualidadetriton pokervida dos colaboradores talvez não seja o melhor.

Chamaram-lhe atenção a semanatriton pokertrabalhotriton poker6 dias,triton pokersegunda a sábado, e o fatotriton pokermuitos dos funcionários moraremtriton pokeralojamentos montados pela própria empresa, já que algumas das plantastriton pokermaior porte ficam afastadas dos centros urbanos.

"Algumas pareciam verdadeiras cidades."

Morillion chama atenção para um ponto parecido.

"Para nós, o que era muito importante era a questão das condiçõestriton pokertrabalho. No Brasil, não existe essa coisatriton pokerdormir na fábrica. Parece bobo para um brasileiro, mas, quando você vai olhar para as fábricastriton pokertênis do outro lado do planeta, as pessoas dormemtriton pokerdormitórios nas fábricas", diz.

Nesse sentido, ele cita como pontos positivos da legislação brasileira a jornada estabelecidatriton poker8 horas por dia, com pagamentotriton pokerhora extra caso se trabalhe mais que isso.

"A gente comparou o Brasil com o que tinha visto na Ásia, e não é que o Brasil tenha uma legislação incrível, mas tem uma legislação", pontua.

"E tem uma democracia. A maioria dos tênis do mundo vem da China, do Vietnã, que são dois países que não têm democracias - então um trabalhador não consegue acessar a Justiça se ele quiser processar a empresa, por exemplo."

Agricultura familiar e sustentável

A produção das marcas Vert e Veja conta hoje com cercatriton poker4 mil funcionários, sendo 500triton pokercontratação direta da Vert/Veja. São 1.500 famílias envolvidas nas associações e cooperativas que fornecem borracha e 1.200 nas que fornecem algodão.

Em relação aos fornecedores, Morillion diz ter se surpreendido com as iniciativastriton pokeragroecologia com as quais se deparou no país, as quais ele associa diretamente aos movimentos sociais no campo, que deixaram como legado associações e cooperativas que há anos produzem com uma lógica da sustentabilidade.

"A gente estava muito pensando na ecologia [quando pesquisamos para começar o negócio]. Quando a gente chega no Brasil, se dá contatriton pokerque a ecologia é um movimento social. A agroecologia é uma luta pelos direitos dos povos originários e das populações tradicionais do campo."

No Acre, diz ele, parte das associações e cooperativas que fornecem borracha para a marca são herdeiros dos "movimentos que nasceram com Chico Mendes".

"No algodão, muitos são ligados aos movimentostriton pokerassentamento; muitos dos nossos produtores são assentados", acrescenta.

O preço da sustentabilidade

Tudo isso custa mais caro do que produzir da forma como a indústria calçadista opera normalmente. No caso da Veja/Vert, o modelotriton pokernegócio busca compensar o custo maior com matéria-prima e mãotriton pokerobra com gasto zerotriton pokerpublicidade, por exemplo. Não há propaganda com celebridades usando as peças da marca ou posts pagostriton pokercontastriton pokerinfluencers nas redes sociais.

"A gente não queria criar uma marcatriton pokerluxo, queríamos fazer um tênis acessível. Não digo que ele é barato, mas pelo menos consegue ter um preçotriton pokeraquisição que é comparável aos outros [marcas multinacionais]", diz Morillion.

Dohmann, da Undo For Tomorrow, ressalta que o custo mais altotriton pokerse produzir no Brasil pode ser um problema com o qual terá que lidartriton pokeralgum momentotriton pokerexpansão da marca, que deve estrear no mercado americano nos próximos meses.

"Um enorme percentual dos benstriton pokerconsumo vendidos na Europa e nos Estados Unidos são produzidos na Ásia. Então, se eu quero concorrer com essas empresas, talvez chegue um momentotriton pokerque vai ficar complicado, sabe?"

Nicho, tendência ou realidade?

A questão do custo também é algo que afeta a decisão dos consumidores, diz Camille Le Gal, fundadora da Fairly Made, empresa que oferece soluções para empresas do mundo da moda que querem rastrear e medir o impactotriton pokerseus produtos.

"Sou uma pessoa muito otimista, realmente acho que a indústria da moda está mudando para melhor. Mas acredito que a sustentabilidade ainda é um nicho, no sentidotriton pokerque é pequena a porcentagemtriton pokerpessoas que escolhe comprar produtos que tenham rastreabilidade e sejam responsáveis", avalia.

Também contribui para esse cenário, ela acrescenta, o fatotriton pokerque não há uma definição propriamente ditatriton pokersustentabilidade a nível internacional. Se não há um padrão, é difícil saber o que exatamente cobrar das empresas - reciclabilidade? durabilidade? usotriton pokermatérias-primas cuja extração não contribua para a destruiçãotriton pokerecossistemas naturais?

Le Gal coloca ainda um terceiro fator: a formulaçãotriton pokernovas leis que balizem o comportamento do mercado e das empresas caminha devagar.

Nesse sentido, a engenheira ambiental Ligia Zottin, que é gerentetriton pokerimpacto e compliance da Veja/Vert, acha que essa frente avança ainda mais lentamente no Brasil.

"O que vejo é que essa pautatriton pokerESG (siglatriton pokeringlês para "environment", "social" e "governance" - meio-ambiente, social e governança,triton pokertradução literal) no Brasil é um pouco atrasada", diz a brasileira, que mora na Europa desde 2016.

"A gente está vendo muitas legislações na Europa e Estados Unidos surgindo, no âmbito do due diligence [diligência prévia,triton pokertradução literal, que se refere à investigação dos riscos e a análise da cadeiatriton pokerfornecedores, por exemplo],triton pokergreenwashing [o marketing enganosotriton pokerpráticastriton pokersustentabilidade que na realidade não existem nas empresas],triton pokertrabalho escravo... E observotriton pokeralgumas discussões que a gente tem com fornecedores que o assunto ainda é muito novo."

Mesmo na ausênciatriton pokerlegislações maistriton pokerlinha com a economia sustentável, entretanto, as empresas vêm sentindo cada vez mais pressão por mudanças, pontua Rafael Benke, CEO da Proactiva, que presta consultoria na áreatriton pokerESG.

De um lado, pelos próprios clientes - ainda que o consumo da sustentabilidade ainda não seja massificado -;triton pokeroutro, pelos investidores.

"Alguns clientes nossos no ano passado tiveram financiamento suspenso porque certos quesitos ESG exigidos pelo financiador não estavam preenchidos. Isso é revolucionário", diz o executivo, que já foi diretor da Vale e líder da iniciativatriton pokerrecursos naturais do Fórum Econômico Mundial.

Para ele, as empresas com boa visão estratégica vão além das exigências da legislação local e se guiam pelas boas práticas internacionais.

"Se você relaxar agora, circunstancialmente, porque alguém está fazendo vista grossa ou porque passou um decreto, por exemplo, a conta vai vir na frente."